Um chefe da Polícia de Segurança Pública (PSP), agora em prisão preventiva por ligações a um grupo neonazi, integrou as listas do partido de extrema-direita Ergue-te à Assembleia Municipal de Lisboa e foi condecorado pelo Estado com uma medalha de prata por comportamento exemplar, um ano após o envolvimento político.

Bruno Napoleão Gonçalves, agente da PSP detido por ser o principal responsável pelo recrutamento do grupo neonazi Movimento Armilar Lusitano (MAL), ocupou o 15.º lugar na lista de candidatos suplentes do partido Ergue-te nas eleições autárquicas de 2021. Esta filiação política — considerada incompatível com o exercício de funções policiais — terá passado despercebida à Direção Nacional da PSP, que alegou desconhecimento total da sua ligação ao partido.

Em 2022, Bruno Gonçalves foi distinguido pelo próprio Estado português com uma medalha de prata por comportamento exemplar, numa decisão oficial datada de abril, e publicada em julho de 2023, constando de um documento de concessão de condecorações a elementos da PSP. Esta distinção terá ocorrido após a sua participação nas listas partidárias, levantando sérias questões sobre os mecanismos de controlo e avaliação interna das forças de segurança.

A informação foi avançada inicialmente pela SIC Notícias e confirmada por outras fontes jornalísticas, como o Notícias ao Minuto, no âmbito da investigação judicial que conduziu à detenção de seis elementos ligados ao MAL. Quatro dos detidos ficaram em prisão preventiva e dois sujeitos a apresentações periódicas.

Segundo o Ministério Público, o Movimento Armilar Lusitano — fundado em 2018 por Bruno Gonçalves — reunia elementos oriundos de grupos extremistas como os Gárgulas de Portugal, Soldiers of Odin, Nova Ordem Portuguesa e Nova Ordem Social, esta última fundada pelo conhecido neonazi Mário Machado. Mediante células autónomas de norte a sul do país, os membros do MAL terão adquirido materiais e impressoras 3D visando fabricar armas e planear ações de natureza terrorista.

Bruno Gonçalves liderava as entrevistas presenciais de recrutamento, privilegiando candidatos com formação militar, agentes da PSP ou seguranças privados. O processo de seleção incluía a análise de boletins pessoais e questionários ‘online’, conduzido em conjunto com outro detido, Bruno Carrilho, motorista de pesados. Os contactos eram realizados mediante aplicações como Telegram e Signal, conhecidas por garantir maior anonimato.

O grupo, segundo as autoridades, visava criar uma estrutura paramilitar para viabilizar uma transformação política e ideológica do país, pondo em causa os alicerces do Estado de direito democrático. O plano passaria por difundir o ódio ao regime e às instituições, criando uma força armada clandestina para apoio a uma futura organização política de cariz neonazi.

A Direção Nacional da PSP já veio a público recordar que qualquer militância partidária é proibida para os seus efetivos, que cabe à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) avançar com um processo disciplinar autónomo.

O escândalo expõe fragilidades internas graves nos mecanismos de rastreio político e ideológico dentro das forças de segurança, especialmente quando se trata de elementos com acesso a informação sensível e capacidade de liderança operacional.

O caso será agora avaliado pelo Ministério da Administração Interna, que já é pressionado para reforçar os instrumentos de controlo sobre os agentes das forças de segurança, nomeadamente no que diz respeito a ligações a organizações extremistas ou partidos com ideologias antidemocráticas.