
Carta Aberta à Sra. Ministra da Saúde Ana Paula Martins, ao Sr. Presidente do Conselho de Administração da ULS de Braga, Dr. Américo Afonso, e à Sra. Diretora Clínica Paula Felgueiras
Exmos. Senhores,
O nosso calvário na Urgência do Hospital de Braga começou às 12h43 do dia 12 de julho, após o devido encaminhamento pelo serviço SNS24 — como manda o protocolo, com triagem prioritária e “melhor encaminhamento”. Pois bem, liguem e confirmem se assim o é.

Desde a chegada até à primeira abordagem passaram-se cerca de três horas. Três horas para um atendimento dito prioritário. Fomos então recebidos por um médico que não falava português e, visivelmente, não tinha qualquer acesso ao histórico clínico do paciente. “O sistema é novo”, dizia. Pois é — novo, mas disfuncional. Um sistema hospitalar onde os médicos não conseguem ver o histórico dos doentes é um atentado à dignidade e à segurança clínica dos utentes.
Durante horas fomos empurrados de exame em exame, sem qualquer tipo de acompanhamento digno desse nome. Ninguém para prestar higiene básica ao paciente, poucos profissionais claramente sobrecarregados, e uma organização que roça o caos humanitário.
A sala de espera era um cenário indigno: pessoas a gemer, a vomitar, deitadas no chão. Um ambiente degradante que não se coaduna com um hospital que se pretende de referência. Vi tudo isto com os meus próprios olhos.
Todos recebiam uma pulseira amarela — teoricamente, triagem de prioridade moderada, com tempo médio de espera de 60 minutos. No nosso caso, foram 3 horas para o primeiro médico… e 10 horas angustiantes até termos algum tipo de resposta clínica.
Enquanto isso, o desespero e a frustração iam aumentando: sem informação, sem apoio, sem respeito. As auxiliares esforçavam-se por chamar os doentes e auxiliar na medida do possível , as enfermeiras davam o que podiam, mas os médicos — essa “casta à parte” — não dirigiam uma palavra aos familiares.
À meia-noite, o médico que acompanhava o caso saiu — sem que fosse transmitida qualquer informação sobre quem assumiria o doente a seguir. Ninguém sabia quem era o novo médico. O sistema (sempre o maldito sistema) não deixava sequer consultar os nomes dos profissionais de serviço. Andei literalmente de porta em porta, a perguntar quem estava com o processo.
Às 1h35 da manhã, lá encontrei o novo médico. Disse-me com indiferença: “Entrei agora, ainda não vi o caso do seu familiar, tem que aguardar.” E aguardei até às 3h da manhã. Depois de 13 horas sem respostas, desisti e vim para casa.
Só às 9h da manhã do dia seguinte fomos contactados por telefone. Afinal, o paciente tinha uma infeção e tinha de ficar internado. O primeiro diagnóstico clínico surgiu 21 horas depois da chegada ao hospital.
Mas o pior ainda estava para vir: na visita das 10h, a secretaria não fazia ideia da localização do paciente, O sistema (sempre o maldito sistema) não deixava sequer consultar a localização do paciente. Fomos nós, familiares, a percorrer a urgência do hospital à procura de sala em sala, até encontrá-lo: com a mesma fralda colocada às 22h do dia anterior, em total abandono, sujo, defecado, sem qualquer cuidado humano mínimo.
Pergunto-vos:
É este o serviço de excelência que pretendem promover?
Onde estão os auxiliares de saúde? Onde está o respeito pela dignidade humana?
A Urgência do Hospital de Braga tinha mais de 50 utentes nas salas de espera das urgências, supostamente, 10 médicos, 2 enfermeiras e 3 auxiliares — e ainda assim demoram horas sem fim para darem respostas mínimas.
O sistema informático não funciona. Diziam que demoraria um dia a implementar — passada uma semana continua a funcionar a “meio gás”. Nem os profissionais sabem o que fazer, quanto mais os utentes. Ninguém sabe nada, ninguém responde por nada.
Como pode um hospital de referência funcionar sem acesso ao histórico clínico do doente?
Como é possível gerir uma unidade de saúde desta dimensão com tamanha ineficiência, desorganização e desumanização?
Como é que os profissionais podem fazer o seu trabalho se estão completamente privados de ferramentas básicas?
Exigimos respostas. E sobretudo, exigimos responsabilidade.
Esta carta aberta é o primeiro passo para tornar pública A Vergonha Silenciada, O Caos, A Desumanização e Abandono da Urgência do Hospital de Braga.
Sra. Ministra, Sr. Presidente, Sra. Diretora Clínica — onde estão?
Vamos ver como correm os próximos capítulos desta saga.
Com indignação,
Paulo Magalhães