Andreas ficou conhecido como o The Trash Traveler, nome que deu ao projeto quando, em 2019, decidiu deixar o trabalho como biólogo molecular para dedicar-se exclusivamente à proteção dos oceanos.
“Juntei todas as minhas poupanças, arrisquei e comecei o The Trash Traveler, projeto que visa chamar atenção para a poluição do plástico”, conta Andreas ao SAPO. Uma mudança radical, “de um emprego estável para uma vida instável”, mas que para este alemão de 31 anos a viver em Portugal está a valer a pena.
Portugal é para Andreas “o país mais paradisíaco da Europa”. “Tem as melhores ondas, uma imensa variedade de costa, uma ótima cultura e um dos melhores cafés”, refere Andreas, que também é surfista. “Dentro de água somos confrontados com a questão do plástico. Se olhares com atenção para as praias vais encontrar plástico em todo o lado. Mesmo se tiveres a impressão de que é uma praia limpa, olha com atenção e vais encontrar infinitos microplásticos”, salienta.
Tudo isso fez com que Andreas tomasse esta decisão. “Fiquei a pensar que estamos a destruir o nosso planeta. Já não é possível limpar todo o microplástico e a situação só piora”.
Se já não é possível limpar de vez o plástico dos oceanos, como vamos resolver o problema? “Precisamos chamar a atenção do público, fazer com que o maior número de pessoas compreenda a situação para que as empresas mudem para comportamentos mais sustentáveis. Isso irá pressionar os governos para regularem a produção de plástico”.
Com a missão de captar a atenção das pessoas para o problema, Andreas resolveu fazer-se à estrada e caminhar. Chamou The Plastic Hike ao périplo de 58 dias que realizou a pé por toda a costa portuguesa, sempre acompanhado com o seu “melhor amigo”, um ukulele em que improvisa canções que versam sobre o plástico. Uma abordagem alegre e informal a um problema sério que, desta forma, consegue chegar a mais pessoas.
Foram 1152 quilómetros percorridos – aos 832 da costa juntaram-se mais 320 quilómetros feitos em limpezas de praias, promovidas pelo The Trash Traveler ao longo do percurso, que ia sendo mostrado através da página de Instagram.
Contou com a participação de 100 organizações não-governamentais, iniciativas, ambientalistas e empresas que integraram o debate sobre a crise do plástico. O trabalho futuro passa por continuar este debate com entidades, como por exemplo o projeto Escola Azul, com quem Andreas já está a colaborar.
580 pessoas participaram nas limpezas de praias. 1,6 toneladas de plástico foi o resultado mais visível da viagem que vai resultar num documentário a ser lançado em 2021. O percurso de Andreas foi registado pela equipa do projeto camerawithnoname. Grande parte do plástico recolhido vai ser transformado em obras de arte para exposições, 21 já confirmadas, promovidas por entidades locais no próximo ano.
Quando chegamos a praias mais remotas o cenário é horrível e chocante
Andreas também tornou visível o plástico presente em zonas mais isoladas da costa. “Onde encontramos cidades e turistas, está bem mais limpo porque as câmaras municipais têm o interesse em deixar limpo para as pessoas”. “No entanto, quando chegamos a praias mais remotas o cenário é horrível e chocante”, indica.
“Entre a praia de Mira e a praia da Tocha, ou na ilha Deserta, perto de Tavira: garrafas de água, de iogurte, copos, em todo o lado. Não é deixado pelas pessoas, é trazido pelas correntes dos oceanos”, diz Andreas, que encontrou plásticos com origem no Sri Lanka, Malásia ou Egito. Outra situação triste foi a encontrada na praia da Bordeira, “uma das mais belas portuguesas tinha ilhas de microplásticos”.
Os três Rs
“É tudo uma questão de educação e conscientização”, considera Andreas, sublinhando que “Portugal está a fazer um bom trabalho nesta área”. “Somos ensinados que podemos reciclar quase tudo. No entanto, continua a ser tranquilo continuar a consumir”. Daí que o trabalho de educar a população seja essencial, sendo um dos objetivos futuros do projeto.
“Recusar, reduzir e reutilizar”. É fundamental diminuir o consumo. “Apenas 14% do plástico em todo o mundo é reciclado. O resto é queimado, vai para aterros e é enviado para países pobres na Ásia e em África”. Grande parte termina no oceano e volta paras as praias dos países desenvolvidos.
It's not my plastic, but it's my world
Portanto, mais do que limpar, é preciso travar o consumo e a produção do plástico. Se por um lado há uma responsabilidade dos estados e das empresas, todos podem adotar comportamentos diários que contribuam para diminuir o uso de plástico. Como escreve muitas vezes no Instagram, "it's not my plastic, but it's my world" (não é o meu plástico, mas é o meu mundo).
“Substituir os produtos de plástico de uso único por produtos mais duradouros, usar sacos de pano, não colocar as frutas em sacos de plástico ou não comprar garrafas de água”, exemplifica, afirmando que existem vários sites e projetos nas redes sociais que se dedicam a mostrar alternativas sustentáveis.
“Nós podemos resolver isso e podemos ganhar a corrida contra a poluição do plástico”, acredita. Até lá, o The Trash Traveler vai continuar por aí, com o seu ukulele, a lembrar que a mudança começa dentro de cada um.