Não estão a ser dias fáceis para o escritor Pedro Chagas Freitas, já que o filho Benjamin fez um transplante de fígado e desde aí teve que voltar várias vezes aos cuidados intensivos.
Agora, o autor volta a dar conta num novo desabafo de que o filho irá voltar ao bloco. Ora, leia mais um grande testemunho deste pai:
A angústia é uma besta. Em breve, provavelmente no começo da próxima semana, o nosso menino vai voltar ao bloco. Desta vez, vai ao dos grandes, talvez para ensinar por lá como é que se faz. Estes dias, antes de isso acontecer, não são dias — são túneis sucessivos no escuro, numa nuvem sem fenda, por um caminho tortuoso pelo meio de postes, árvores, armadilhas, emboscadas, balas que chegam de todos os lados. É isso o que somos quando estamos neste estado de ansiedade-limite: peões, soldados, numa guerra sem nome, sem denominação possível, sem enquadramento estratégico. A única estratégia é respirar, fazer tudo o que for possível para respirar, para juntar uma expiração a uma inspiração, num exercício que parece simples, mas que no lugar onde estamos é uma intrincada, e complexa, equação, que só os maiores especialistas na matemática do medo conseguirão descodificar. Não sou, ainda, um desses, não sei se quero ser, não sei se desejo a alguém que o seja. Desejo apenas não passar de um amador desta porcaria toda, desejo para sempre não sentir mais isto, mais nada disto, nem mais um segundo disto. Serei, sem querer, um mestre da supra-angústia, da supra-dor, quando só queria ser um leigo total. Se é o vosso caso, aproveitem bem, deliciem-se com tudo, suguem cada instante de normalidade. É normalmente nela que a vida que interessa acontece.