As grandes empresas tecnológicas norte-americanas não têm tido a vida facilitada nos últimos anos. As investigação da Comissão Europeia (CE), que visam garantir a concorrência leal e a proteção dos consumidores no mercado digital europeu, já custaram vários milhares de euros a empresas como a Apple, a Google e a Meta (dona do Facebook e do WhatsApp, entre outras plataformas).
Num período de mudança nos Estados Unidos, com o regresso de Donald Trump à Casa Branca, o futuro destas gigantes da tecnologia pode ser, contudo, mais positivo. De acordo com o “Financial Times”, Bruxelas está a reavaliar todos os casos, lançados desde março do ano passado, ao abrigo do regulamento sobre os mercados digitais, que abrangem as investigações à Apple, à Google e à Meta.
Dois funcionários da UE afirmaram ao jornal britânico que os reguladores de Bruxelas estão, de momento, à espera de uma orientação política para tomar as decisões finais.
A notícia surge poucos dias depois de Mark Zuckerberg, o diretor-executivo da Meta, ter pedido a Donald Trump que impedisse a UE de multar as empresas de tecnologia americanas.
“Acredito que seja uma vantagem estratégica para os Estados Unidos o facto de termos muitas das empresas mais fortes do mundo, e penso que deve fazer parte da estratégia dos Estados Unidos defender isso”, disse na sexta-feira, no podcast do comediante norte-americano Joe Rogan.
No final de março, a Comissão Europeia abriu uma investigação contra a Alphabet (dona da Google), a Apple e a Meta ao abrigo da nova lei dos mercados digitais (em inglês Digital Markets Act - DMA). As coimas podem ir até aos 10% do volume de negócios total da empresa em questão, a nível mundial, podendo ascender a 20% caso a infração seja repetida.
Google investigada sobre imposição de serviços próprios no motor de busca
No que diz respeito à Alphabet, a Comissão Europeia suspeita que a apresentação dos resultados de pesquisa da Google “pode conduzir a uma autopreferência” dos serviços detidos pela empresa, (como o Google Shopping, o Google Flights e o Google Hotels), em detrimento dos serviços da concorrência.
“A Comissão Europeia está preocupada com o facto de as medidas aplicadas pela Alphabet para dar cumprimento à DMA poderem não garantir que os serviços de terceiros que figuram na página de resultados de pesquisa da Google sejam tratados de forma justa e não discriminatória em comparação com os próprios serviços da Alphabet”, referiu o organismo, num comunicado enviado a 25 de março do ano passado.
Bruxelas está, também, a investigar se as regras internas da loja de aplicações da Google (Google Store) violam a lei dos mercados digitais.
Num comunicado enviado à Lusa, citado pela CNN Portugal, Oliver Bethel, o diretor da área de concorrência da Google, respondeu à Comissão Europeia dizendo que “para cumprir com a lei dos mercados digitais” foram realizadas “alterações significativas” na forma como os serviços da multinacional operam a nível europeu.
“Colaborámos com a Comissão Europeia, com stakeholders e terceiros em dezenas de eventos ao longo do ano passado para receber e responder ao feedback e para equilibrar necessidades contraditórias no ecossistema”, referiu. “Nos próximos meses vamos continuar a defender a nossa abordagem”, acrescentou. Até ao dia de hoje, a investigação ainda não teve um desfecho final.
Segundo a BBC, a Google já acumulou um total de multas por parte da União Europeia no valor de 8,2 mil milhões de euros.
Apple acusada de restringir a concorrência na sua loja de aplicações
À semelhança do que se passou com a Google, a Apple foi acusada de restringir a concorrência na sua loja de aplicações, a App Store, violando assim a Lei dos Serviços Digitais. O julgamento começou esta segunda-feira e vai estender-se até dia 28 de fevereiro.
O regulador europeu considerou que as condições comerciais da fabricante do IPhone não davam liberdade aos criadores de aplicações. “Por exemplo, os programadores não podem fornecer informações sobre preços na aplicação ou comunicar de qualquer outra forma com os seus clientes para promover ofertas disponíveis em canais de distribuição alternativos”, escreveu a CE, em junho do ano passado.
Paralelamente, a Comissão Europeia também começou a investigar as comissões que são cobradas pela Apple aos programadores pelas aplicações e subscrições que vão sendo vendidas através da App Store. De acordo com o organismo de Bruxelas, “as taxas cobradas pela Apple vão além do estritamente necessário para essa remuneração”.
Num comunicado público, a empresa defendeu-se dizendo que “desde o lançamento da App Store, há mais de 15 anos, a Apple tem dois objetivos simples: criar um mercado seguro para os utilizadores e uma oportunidade de negócio incrível para os programadores”. “Ao longo do tempo, a App Store tem ajudado programadores de todas as dimensões a criar empresas de sucesso e a chegar a pessoas de todo o mundo”, acrescentou.
Em março do ano passado, a Apple foi multada pela Comissão Europeia em 1,84 mil milhões de euros, por abuso de posição dominante na App Store para fornecedores de streaming de música, depois de uma queixa do Spotify.
Tal como o Expresso noticiou, o executivo comunitário disse que a empresa norte-americana “aplicou restrições aos criadores de aplicações, impedindo-os de informar os utilizadores de iOS [sistema operativo da Apple] sobre serviços de subscrição de música alternativos e mais baratos disponíveis”.
Uma das disputas mais conhecidas, que envolve os dois organismos, remonta a 2016, altura em que a fabricante do IPhone foi acusada de receber benefícios fiscais ilegais por parte do Governo irlandês, entre 1991 e 2014. A Apple foi, assim, condenada ao pagamento de 13 mil milhões de euros, mais juros, o valor correspondente aos impostos alegadamente não pagos durante o respetivo período. A decisão foi contestada tanto pela Apple como pelo executivo irlandês e, em julho de 2020, o Tribunal Geral da União Europeia (TGUE) considerou ilegal a deliberação europeia.
O caso voltou a ser analisado, depois de em 2023 um conselheiro do TGUE ter-se posicionado a favor de Bruxelas e sugerido que os juízes do tribunal devessem anular a decisão. O pedido acabou por ser ouvido e, em setembro, o Tribunal de Justiça da União Europeia voltou a restabelecer a deliberação inicial da Comissão Europeia.
Facebook: modelo de “pagar ou Consentir” pode violar legislação europeia
No que diz respeito à Meta, a CE concluiu, após uma investigação preliminar, que a empresa utiliza um modelo de “pagar ou consentir” que viola a legislação europeia. Este mecanismo obriga os consumidores a pagar um valor à Meta para que os seus dados não sejam utilizados pela empresa. As informações recolhidas são utilizadas, por exemplo, na seleção de anúncios personalizados conforme os interesses de cada utilizador.
“Temos sérias dúvidas de que este consentimento [de utilizar os dados dos utilizadores] seja realmente livre quando se é confrontado com uma escolha binária”, escreveu a Comissão Europeia, em março.
Como resposta às exigências europeias, a Meta anunciou, em novembro, a redução do preço da subscrição sem anúncios em 40% e a criação de uma nova opção que permite a utilização gratuita do Facebook e do Instagram, “com anúncios menos personalizados”. “Na opção menos personalizada, utilizaremos muito menos dados para apresentar anúncios”, esclareceu.
“Estamos a implementar estas alterações significativas em resposta às exigências dos reguladores da UE, apesar do feedback ir além do que é exigido por lei. Os estudos mostram que as pessoas e as empresas preferem anúncios personalizados que apoiam o emprego e o crescimento económico e dão às pessoas acesso a serviços online gratuitos”, comentou.
Nesse mesmo mês, a Meta foi multada pela CE em quase 797,72 milhões de euros, por ter violado regras europeias de posição dominante no mercado de anúncios classificados online através do Marketplace, impondo “condições comerciais desleais a outros prestadores de serviços”.