
E quando os craques se levantam e erguem nas bicicletas, acelerando e sprintando e lutando entre eles, o maior dos craques levanta-se, ergue-se, eleva os braços em triunfo. Uma vez, mais uma vez. 100 vezes, não 100 vezes quaisquer, não 100 vezes em corridas menores, mas quase sempre nestes cenários.
Aqui, no Tour, foi a 18.ª vez. Só sete ciclistas na história têm mais. Nesta edição foi a estreia. E que estreia.
Na 4.ª etapa da Volta a França, Tadej Pogačar triunfou. Foi a 100.ª vitória da carreira, um êxito no local perfeito, no momento certo, contra os rivais de sempre.
Lá houve sprint entre o tricampeão do Tour e Mathieu Van der Poel, tal como há dois dias. Só que, desta vez, o esloveno triturou o neerlandês, deixou-o sem resposta, deixou-o para segundo. Foi a imagem perfeita, sonhada por qualquer patrocinador, o camisola de arco-íris, campeão do mundo, superando o camisola amarela, líder da maior das competições.
Para Pogi escrever a 100.ª sinfonia da sua genialidade, houve fundamental ajuda portuguesa. "O João fez um trabalho fantástico", constatou o esloveno no final quanto ao companheiro na Emirates.
Na Rampe Saint-Hilaire, 800 metros a 9,4% de média, com rampas perto de 20%, o caldense abriu o terreno do ataque do líder. Depois, na parte plana, foi respondendo a perigosos ataques de Evenepoel ou Jorgenson. Na meta, lançou o sprint.
João terminou em 6.º a jornada, subindo ao 8.º da geral. O líder mantém-se Van der Poel, com o mesmo tempo de Pogačar. Vingegaard é 3.º, a 8 segundos. Almeida está a 55 segundos da amarela.
Os 174,2 quilómetros da jornada, com partida em Amiens e chegada a Rouen, pretendiam homenagear Jacques Antequil, uma das lendas maiores do ciclismo e filho destas terras da Normândia. Com oito triunfos em grandes voltas, só as 10 vitórias de Hinault e as 11 de Merckx o superam. Os seus cinco Tours deixam-no como o mais ganhador da competição, a par dos dois nomes já referidos e de Miguel Induraín.
Quando Anquetil ganhou a sua última Volta a França, em 1964, os franceses haviam arrecadado a geral final em 25 de 51 edições. Desde então, só venceram 11 vezes em 60 anos, a última delas em 1985, com Hinault.
O caminho até Rouen, onde Joana d'Arc foi executada em 1431, tinha cinco contagens de montanha nos 50 quilómetros finais, três de quarta categoria e duas de terceira. Era, tal como na segunda etapa, mais um dia de sobe e desce final, de colinas, próprio para puncheurs, para atacantes com forte capacidade de mudança de velocidade. O percurso voltava a ter várias armadilhas, com estreitamentos de estrada e curvas apertadas, ingredientes que, unidos à tensão e nervosismo, criavam a receita para quedas. Desta feita, após o abandono de Philipsen, Alaphilippe foi o único nome de destaque a ir ao asfalto.
A Visma, de Vingegaard, trabalhou para partir o pelotão nas rampas finais. No entanto, na última das subidas, foram a Emirates e João Almeida a prepararem a ofensiva do campeão do mundo.
Pogi atacou e só Jonas o seguiu. A uns 100 metros do topo da colina, com pendentes de 15%, Tadej soltou Vingegaard. A imagem fazia lembrar o Tour passado, o esloveno a ir embora e o dinamarquês a ficar. Mas este Jonas não parece ser aquele Jonas, que há 12 meses estava inferiorizado pela gravíssima queda no País Basco. O vencedor de 2022 e 2023 conseguiu apanhar o triunfador de 2020, 2021 e 2024. Habemus Tour, ao que parece.
Chegou-se à meta e João lançou o líder. Van der Poel era o favorito para triunfar, mas a 100.ª sinfonia de Tadej teve prioridade. A vitória 100, no momento certo, contra os melhores rivais. E com toque português.
A 5.ª etapa terá momento importante para a geral. Há contra-relógio, a única tirada com esta especialidade em terreno plano na presente edição. São 33 quilómetros com partida e chegada a Caen.