
Domingos Soares de Oliveira, antigo CEO do Benfica, negou esta quinta-feira o envolvimento em qualquer alegado esquema de circulação de dinheiro vivo, descrito pela acusação no processo 'Saco Azul'. O agora dirigente do Al-Itthad Jeddah, que testemunhava na 14ª sessão do julgamento, que decorre no Campus da Justiça, em Lisboa, atirou para Miguel Moreira, antigo diretor financeiro das águias, a responsabilidade pela negociação dos contratos com a Questão Flexível, de José Bernardes.
Último arguido a depor, precisamente um dia depois de ter completado 65 anos, o gestor insistiu num ponto. "Nunca lidei com a Questão Flexível nem conheço José Bernardes", garantiu Soares de Oliveira na manhã desta quinta-feira, durante quase três horas, respondendo às perguntas do presidente do coletivo juízes, Vítor Teixeira de Sousa, da procuradora do Ministério Público e de advogados. "Não tive conhecimento de qualquer plano", insistiu.
Acusado de três crimes de fraude fiscal e 19 de falsificação de documento, em coautoria com a Questão Flexível e José Bernardes, também arguidos, Soares de Oliveira reconheceu, no entanto, a sua assinatura e a sua rubrica no contrato entre aquela empresa e a Benfica SAD, quando confrontado com o mesmo. E também noutro contrato em que a Best For Business cedeu a posição contratual à Dynethic. Foi através destas empresas que Bernardes começou a prestar serviços aos encarnados, antes de ser constituída a Questão Flexível, que cobrava aos encarnados 22 mil euros mensais.
"Assinei, em média, 20 contratos por dia. Em quase 20 anos, assinei dezenas de milhares de contratos", sublinhou Soares de Oliveira, antes de distinguir o contrato em causa com o da NOS, por exemplo. "Há contratos que merecem mais intervenção e há outros mais operacionais em que não entrava nos detalhes", adiantou, assegurando desconhecer a existência de qualquer saco azul.
A acusação refere que Luís Filipe Vieira foi o mentor de um alegado esquema, que envolveu Miguel Moreira e Soares de Oliveira. Mas o ex-CEO das águias defendeu-se ontem, contrariando a tese da acusação, respondendo sempre com um "não" às perguntas do juiz sobre se conhecia a existência de um saco azul ou circulação de "dinheiro vivo". "Não tenho conhecimento de qualquer discussão entre Luís Filipe Vieira e Miguel Moreira relativamente a algum plano. Mas é absolutamente falso que tenha aderido a algum plano. "Tenho 42 anos de atividade profissional, trabalhei em vários países e é a primeira vez que estou nesta posição, o que demonstra a confiança das entidades em mim. Se fosse confrontado com uma situação dessas não pactuaria com ela", asseverou.
O gestor explicou que foi Miguel Moreira, que definiu como "negociador implacável", o responsável pelos contratos com as referidas empresas, relacionados com a transformação digital no Benfica. "Ele tinha autonomia e plenos poderes para negociar, tal como tinham outros responsáveis de área. As substâncias dos contratos não eram discutidas em reunião do Conselho de Administração", referiu, adiantando, mais tarde, que foram pedidas explicações a Miguel Moreira depois das buscas da Polícia Judiciária ao Benfica. Também deixou claro que não participou em qualquer reunião com as referidas empresas, apenas com a McKinsey e a Microsoft.
O contrato com a Questão Flexível - empresa constituída por José Bernardes e a mulher deste, que é contabilista - previa um serviço de "alta disponibilidade" para resolver qualquer problema, 24 horas por dias, sete dias por semana, e outros já previstos no acordo a Dynethic. Ou seja, uma "sobreposição de serviços", como se tem dito nas várias sessões do julgamento. Reitando que não conhecia o contrato, o antigo gestor informático considerou que 22 mil euros por um serviço de alta disponibilidade é "absolutamente razoável". Ainda assim, fez saber que até hoje desconhece "as capacidades técnicas de José Bernardes", embora apontando à escassez de pessoal qualificado em Portugal.
Nesta sessão, Soares de Oliveira disse ainda desconhecer uma folha de Excel, onde constam valores e as iniciais 'JB' e 'MM', alegadamente relacionadas com José Bernardes e Miguel Moreira. Entrando em detalhes sobre o funcionamento das águias, explicou que cabia a Paulo Alves, responsável da área financeira, fazer o pagamentos e que pagar a totalidade de um contrato antes deste estar concluído "seria uma situação anómala". "Nunca vi sacos ou cofres nem dinheiro vivo, para nenhum fim", reiterou.