Se em cada cantinho há um português, no futebol há um sítio perfeito para os descobrir. Também é publicidade, mas a resposta clara é: no zerozero. Pois bem, foi a prepararmos a viagem a Frankfurt que descobrimos, nas muitas pesquisas nos armários desta casa, Nélson Morgado, que há um ano coadjuva Dino Toppmöller no Eintracht.

O passado como analista, num trajeto de evolução, é pouco conhecido. O futuro, atendendo a ter apenas 37 anos, sugere que vai ter reconhecimento.

Não o contactámos para saber o que acha que vai acontecer no jogo, ou sequer que ambiente se vai sentir na Deutsche Bank Park. Há todo um contexto para descobrir. Nélson já está em Frankfurt a preparar a nova época, com muitos aviões por cima e com muitas lupas na mão para estudar os opositores.

Vai ao jogo com a mulher e os filhos, que o acompanham para todo o lado e que se fixaram no coração financeiro europeu para esta aventura. Um dos três anos do contrato já foi cumprido e correu muito bem.

«No Mónaco, disseram-me que analista podia ser pouco para mim»

zerozero: Esta ligação ao Eintracht pretende-se que seja a curto ou longo prazo?

Nélson Morgado: No ano passado, fizemos uma ligação de três anos. Esta época, cumprimos os objetivos. Sou uma pessoa que gosta de estar sempre com a família, com os meus filhos, acompanhar o crescimento deles. Transferi-me do Mónaco para aqui, já sabemos que no futebol é tudo mais incerto, mas esta época correu bem e a próxima vai ser ainda melhor.

zz: Se está em Frankfurt com a família, aconselha a cidade de olhos fechados?

NM: É uma grande cidade, com cerca de 800 mil habitantes, é o centro da Europa e vemos bem isso. Os nossos campos de treino são ao lado do aeroporto e sofremos um bocadinho, porque a cada 20 ou 30 segundos está um avião a passar, o que complica a tarefa durante o treino. [risos] A cidade é bonita, passa o rio Main (Meno, em português), à beira dele fazem a maior parte dos convívios, é onde está a Fanzone nesta altura. Há muitas nacionalidades diferentes ao longo de todo o ano.

zz: Um português a implementar-se em Frankfurt é um processo simples?

NM: O mais complicado foi a nível burocrático. Há muita papelada para resolver assim que chegamos, porque é um país com estrutura e organização, portanto há muitas inscrições a fazer para estar tudo legal, mas não me posso queixar desse processo, pois fui muito ajudado pelas pessoas do clube. Eles têm gente a ocupar-se do pessoal que chega ao país e ajudaram-me bastante nesse momento. Por exemplo, chegava muito correio e, mesmo com a tradução no telemóvel, nem sempre dava para perceber a mensagem. Foram úteis para mim, para a inscrição dos miúdos na escola. É um clube muito acolhedor.

zz: No dia-a-dia, o que há que possa atrair um português?

NM: Na verdade, não saio muito. O trabalho não dá muitas horas vagas. E mesmo a família também não sai muito, que o tempo não é muito famoso. Tivemos direito a nove ou dez meses de chuva [risos], complica um bocadinho. É um grande centro financeiro, é uma cidade de business, por albergar o Banco Central Europeu, também há muita gente a trabalhar na bolsa. Nota-se que há muita gente de passagem, vêm do estrangeiro com missões a tempo determinado, vão embora e vêm outros. A nível social e cultural, há diversas nacionalidades: muitos paquistaneses, que trabalham na indústria, também índios, chineses e coreanos na engenharia automóvel, turcos e italianos na restauração... Foi muito engraçado ver aqueles cartazes em Dortmund do bacalhau e da bifana melhor que o kebab [risos].

zz: Há algum restaurante português em Frankfurt?

NM: Costumo ir com a família à Tasquinha do Jacinto, para matar saudades. Recomendo.

zz: É, para muitos, uma cidade de passagem, pelo que me está a dizer. Para o Nélson, será cidade para ficar?

NM: Estando eu no futebol, considero que também estou de passagem, mas não sei por quanto tempo. Gosto de alguma estabilidade, mas já sabemos que no futebol é tudo muito rápido e os resultados é que ditam o futuro.

zz: Numa carreira que se nota que é a pulso, como se processou esta nova função na equipa de Toppmöller?

NM: Atualmente, estou como adjunto na parte da análise e chefio um escritório desse departamento, onde estão quatro alemães. Está a correr bem, nunca fui de me expor muito na comunicação social, mas, com o tempo, vai aparecendo. Vou crescendo aos poucos, comecei como analista no Luxemburgo, passei pelo Monaco e agora vim ter com ele. O Dino Toppmöller é que apostou em mim no início, no Dudelange, acreditou em mim numa época em que fomos felizes com a ida à Liga Europa. Ele depois foi adjunto do Naggelsmann no Leipzig e no Bayern. Eu fui para o Mónaco para ser adjunto do Niko Kovac, ganhei experiência e surgiu esta oportunidade.

zz: Qual é o objetivo pessoal do Nélson?

NM: Eu nunca fui obcecado por ser treinador principal, mas as coisas vão acontecendo naturalmente. Sempre gostei de estar na minha zona de conforto, mas fui saindo aos poucos. No Mónaco, disseram-me que analista podia ser pouco para mim, então fui evoluindo e acho que tenho mais pela frente. Mas estou no caminho certo para ter sucesso como adjunto e depois logo se verá. Mas tenho também de me formar.

zz: Como clube, que Eintracht é este? Recentemente, esteve na Liga dos Campeões e jogou contra o Sporting...

NM: É um clube imenso, imenso! Vi uma grande diferença do Monaco para aqui, não tanto a nível de qualidade de jogadores, mas mais a nível de estrutura e organização. No Mónaco, o estádio estava muito vazio, com três ou quatro mil adeptos por jogo. Ali é lotação esgotada todos os jogos, 58 mil pessoas. É um clube que está a crescer pouco a pouco, mas muito estruturado, para não se entrar em excesso de expectativa, para não cair como o Schalke 04 na segunda liga. Este clube está a fazer muito dinheiro, quer no merchandising, quer na venda de jogadores, mas não se iludem com isso nem entram em loucuras com grandes compras ou ordenados. Respeitam o orçamento e nunca sonham mais alto que o expectável. Querem dar jogos europeus aos seus adeptos a cada ano e as últimas classificações demonstram isso, com o sétimo lugar do ano passado e o sexto deste ano. Se pudermos ganhar um lugar a cada ano...

zz: Portanto, podemos habituar-nos a ver o Eintracht nos sorteios da UEFA.

NM: Sim, é esse o objetivo. Objetivo mínimo.

zz: E vamos ouvir falar mais do Nélson?

NM: Acredito que sim, trabalho para isso. Estou num grande clube num dos grandes campeonatos. Se ficamos em sexto lugar, significa que estamos nas 30 melhores equipas da Europa. É difícil encontrar melhor, vamos ver as oportunidades.

zz: Se amanhã surgisse algum convite para treinar em Portugal, como seria?

NM: [risos] Pode acontecer, mas estou consciente do que tenho de fazer primeiro, que são os diplomas. Inscrevi-me este verão no curso de UEFA B, mas infelizmente foi cancelado, vou ter de esperar por uma nova oportunidade.