
Desde a aquisição pela família Glazer em 2005 - já tinha participações minoritárias anteriores, mas nesse ano ficou com 57% das ações, o Manchester United tem estado envolvido num ambiente de críticas e controvérsia, promovido por adeptos, analistas e antigos jogadores. Duas décadas de instabilidade e indefinição. Embora no início se tenham testemunhado conquistas significativas, como títulos da Premier League e uma Liga dos Campeões, essas são quase totalmente atribuídas à ainda presença de Alex Ferguson, sendo a gestão amplamente contestada por decisões financeiras e administrativas que muitos consideraram prejudiciais à identidade e ao desempenho do emblema.
Nos primeiros anos sob a liderança dos Glazer, o Manchester United conquistou três títulos consecutivos da Premier League entre 2006 e 2009, além da Liga dos Campeões em 2008. Esses sucessos, como já se disse, ocorreram durante a gestão de Sir Alex Ferguson, que se reformou em 2013. Desde então, o clube enfrentou dificuldades para manter a consistência, passando por vários treinadores e não conseguindo conquistar o campeonato desde então.
De 2005 a 2024, os Red Devils arrecadaram 13 troféus: 5 Premier Leagues (2006–07, 2007–08, 2008–09, 2010–11, 2012–13), 1 Liga dos Campeões (2007–08), 1 Mundial de Clubes da FIFA (2008), 1 Taça de Inglaterra (2016), 4 Taças da Liga (2006, 2009, 2010, 2017) e 1 Liga Europa (2016–17). Comparando com as duas décadas anteriores à chegada da família norte-americana ao poder (1985–2005, início da era Ferguson foi em 1986), venceu 22 troféus: 8 títulos da Premier League (1992–93, 1993–94, 1995–96, 1996–97, 1998–99, 1999–2000, 2000–01, 2002–03), 5 Taças de Inglaterra (1990, 1994, 1996, 1999, 2004), 1 Taça das Taças (1991), 1 Supertaça Europeia (1991), 1 Liga dos Campeões (1999), 1 Taça Intercontinental (1999), 1 Taça da Liga (1992), 4 Supertaças Inglesas (1990, 1993, 1994, 1996).
Desde a saída de Fergie, o United contratou vários treinadores, na tentativa de restaurar o sucesso obtido com o escocês. O primeiro até foi um compatriota, David Moyes (2013–2014), mas sem grande sucesso, seguindo-se Louis van Gaal (2014–2016), José Mourinho (2016–2018), Ole Gunnar Solskjaer (2018–2021), Ralf Rangnick (interino, 2021–2022), Erik ten Hag (2022–2024) e agora Rúben Amorim (2024-). Tantas mudanças refletem a instabilidade e a falta de visão clara para o futuro.
No que diz respeito à situação financeita, a aquisição do Manchester United pelos Glazer foi altamente controversa devido à dívida significativa imposta. Antes da compra, o clube estava livre de dívidas, mas a aquisição alavancada - Leveraged Buyout é uma transação em que uma empresa é adquirida principalmente com financiamento por dívida, em vez de capital próprio do comprador; o comprador usa os ativos da empresa como garantia para o empréstimo, com a expectativa de que o fluxo de caixa da empresa seja suficiente para pagar a dívida - resultou em encargos financeiros substanciais. Ao longo dos anos, os Glazer retiraram mais de 1,4 mil milhões de libras (1,7 mil milhões de euros) em dividendos, vendas de ações e outras transações, enquanto a dívida do clube permaneceu elevada, prejudicando investimentos nas infraestruturas e no plantel.
Outra das principais críticas é a aparente falta de envolvimento com os assuntos do clube. Raramente vistos em Old Trafford, os proprietários são olhados como distantes e mais interessados nos aspectos comerciais do que no seu sucesso esportivo. Essa desconexão alimentou o descontentamento dos adeptos, que se sentem ignorados e desrespeitados.
A resistência dos adeptos foi tão profunda que, logo após a confirmação da aquisição pelos Glazer, um grupo de adeptos decidiu cortar totalmente os laços com o clube e fundar outro: o FC United of Manchester. Criado em 2005, o clube nasceu como projeto comunitário, gerido democraticamente por adeptos que rejeitavam o modelo empresarial imposto pelos novos proprietários de Old Trafford. O FC United representa, até hoje, um símbolo de oposição à direção dos Glazer e da defesa dos valores tradicionais do futebol inglês, como a acessibilidade, a comunidade e a paixão autêntica.
Ao longo dos anos foram surgindo aqui e ali protestos sobre a gestão e, em 2021, o anúncio da participação do Manchester United na Superliga Europeia levou a manifestações massivas a à invasão do estádio, levando mesmo ao adiamento de um jogo contra o rival Liverpool. Movimentos como o Green and Gold, que utiliza as cores originais do clube, tornaram-se ícones dessa resistência.
Em fevereiro de 2024, Sir Jim Ratcliffe, através da sua empresa INEOS, adquiriu uma participação minoritária de 27,7% no clube, assumindo o controle das operações de futebol. A mudança foi vista como tentativa de reverter o declínio, com o novo responsável a implementar medidas de austeridade para estabilizar as finanças e ainda uma abordagem mais estratégica para as operações em torno do futebol. Apesar de algumas decisões impopulares, como cortes de pessoal e aumento de preços, até a limitação da oferta de bilhetes para a família do staff poder estar hoje em Bilbau, na final da UEFA Europa League, muitos adeptos veem na sua liderança uma oportunidade para restaurar a competitividade do Manchester United. Ainda que os resultados na Premier League não convençam toda a gente.
A era dos Glazer será, até prova em contrário, lembrada por uma gestão financeira controversa, instabilidade técnica e um afastamento crescente entre o clube e os seus adeptos. A fundação do FC United of Manchester é um dos legados mais simbólicos desse período, marcando a rutura de uma parte da base com o modelo comercial que passou a dominar Old Trafford. A entrada de Ratcliffe (e, com ele, de Ruben Amorim) representa uma nova direção, com a esperança de que o Manchester United possa recuperar sua identidade e posição de destaque no futebol mundial.