O Ministério da Saúde afirmou que, quando foi presidente do Hospital de Santa Maria, Ana Paula Martins "não recebeu nenhum reporte" de anomalias relacionadas com as cirurgias adicionais, salientando que o acompanhamento era feito pelo diretor clínico.

"O conselho de administração da Unidade Local de Saúde (ULS) de Santa Maria, presidido por Ana Paula Martins - em funções entre 1 fevereiro de 2023 e 31 janeiro de 2024 -, não recebeu nenhum reporte, dos administradores hospitalares dos serviços ou diretores de serviços, que pudesse identificar desvios ou anomalias relacionadas com o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos em Cirurgia" (SIGIC), adiantou o ministério em resposta enviada à Lusa.

O gabinete de Ana Paula Martins salientou ainda que o então diretor clínico, que se mantém em funções no atual conselho de administração da ULS de Santa Maria, "tinha um acompanhamento próximo de toda a atividade clínica, particularmente da cirurgia adicional".

Em causa está o valor pago pelas cirurgias feitas em horário adicional na ULS de Santa Maria, que subiu mais de 50% de 2022 para 2023, no ano em que a atual ministra da Saúde dirigiu o hospital.

Os números das cirurgias adicionais

Os dados enviados à Lusa pelo hospital indicam que, em 2022, foram pagos 9.402.120 euros pelas 7.495 cirurgias feitas em horário adicional e, em 2023, a ULS pagou 14.232.377 euros (+51,3%) por 9.971 daquelas cirurgias. Em 2024 o número de cirurgias em horário adicional subiu para 12.322, pelas quais a ULS pagou 14.510.334 euros.

A informação do hospital indica que o valor médio pago por cirurgia em horário adicional desceu de 1.427 euros 2023 para 1.177 euros em 2024, um ano em que o hospital bateu recordes de cirurgias, com um total de 37.647 realizadas, cerca de um terço das quais em horário adicional (12.322).

O ministério referiu ainda que as cirurgias adicionais dependem de acordos estabelecidos entre os conselhos de administração das unidades do SNS e os serviços, que contratualizam as quantidades a realizar e a percentagem de distribuição pelas equipas envolvidas.

"No caso da ULS de Santa Maria houve um esforçou para operar o maior número de doentes que aguardavam uma cirurgia e que se tinham acumulado em listas de espera no período pandémico devido à suspensão das cirurgias programadas", adiantou a mesma fonte.

Em 2021, 2022 e 2023 foram tomadas várias medidas pelo Ministério da Saúde para recuperar listas de espera acumuladas durante a pandemia, como o reforço de incentivos à produção adicional e a criação de planos específicos de recuperação da atividade cirúrgica.

A polémica do dermatologista que ganhou 400 mil euros

Na última sexta-feira, a CNN revelou que um dermatologista do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, terá recebido cerca de 400 mil euros em 10 sábados de trabalho adicional em 2024, o que levou o Ministério Público a abrir um inquérito a este caso e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) a avançar com um outro inquérito à atividade cirúrgica adicional realizada no SNS.

Em causa está o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC) que o Governo pretende substituir por um novo modelo - o Sistema de Informação Nacional de Acesso a Consulta e Cirurgia (SINACC).

Em março deste ano, o Ministério da Saúde criou, através de um despacho, um grupo de trabalho para preparar a extinção do SIGIC e a implementação do SINACC, uma das medidas previstas no plano de emergência e transformação da saúde que o Governo aprovou em maio de 2024.

Na quinta-feira, a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, reconheceu lacunas no SIGIC, por ser permeável a "incentivos perversos" atribuídos aos profissionais de saúde.