Num momento de reflexão que antecedeu a mesa redonda intitulada ‘Programas de Cidadania: uma ponte sustentável?’, Licínia Freitas, responsável pelo Núcleo Regional da Madeira da Rede Europeia Anti Pobreza – Portugal (EAPN), trouxe à discussão o papel crucial das empresas no combate à pobreza.

A intervenção centrou-se na urgência de enfrentar uma realidade persistente e multifacetada, que afecta actualmente cerca de 1,8 milhões de pessoas em Portugal, a viver com menos de 632 euros mensais (dados de 2023). Sublinhou os impactos sociais e económicos da pobreza, referindo que esta está profundamente enraizada em desigualdades estruturais e que exige uma resposta integrada e colaborativa.

Com especial enfoque na Região Autónoma da Madeira (RAM), Licínia Freitas identificou causas específicas que agravam o fenómeno da pobreza na região: o contexto insular e a limitada acessibilidade, marcada por custos de transporte elevados, a dependência do turismo e a consequente vulnerabilidade a flutuações económicas, os custos elevados da habitação impulsionados pela pressão turística, e os desafios demográficos, nomeadamente o envelhecimento populacional e a emigração de jovens.

Apesar deste panorama, destacou um dado encorajador: a RAM registou “a redução mais expressiva da taxa de pobreza a nível nacional” entre 2023 e 2024, fixando-se abaixo dos 20%. Ainda assim, 5,4% da população madeirense continua em situação de privação material e social severa.

Entre as principais dificuldades das famílias madeirenses, destacam-se a falta de mobiliário adequado (36,2%), a impossibilidade de fazer férias anuais (35,4%), o peso das despesas correntes (29,9%) e a falta de aquecimento (15,7%).

A responsável da EAPN alertou para os grupos familiares mais vulneráveis à pobreza: famílias monoparentais (31,0%), famílias unipessoais (28,6%), famílias numerosas (28,2%) e casais com pelo menos um idoso (18,3%).

Também o estatuto laboral foi analisado como factor determinante, com 9,2% dos empregados, 44,3% dos desempregados, 19,6% dos reformados (com um aumento de 4,2% face a 2022) e 30,4% de outros inactivos em risco de pobreza.

A educação surge, por outro lado, como uma das chaves para mitigar este risco. Segundo os dados apresentados, 23,5% das pessoas com escolaridade até ao ensino básico estão em risco de pobreza, percentagem que desce para 12,3% entre os que completaram o ensino secundário ou pós-secundário, e para 6,5% entre os que concluíram o ensino superior.

Dirigindo-se ao sector empresarial, a dirigente da EAPN apelou a uma participação activa e consciente das empresas na construção de soluções sustentáveis. Destacou o potencial de transformação que pode emergir da colaboração entre empresas e entidades da economia social, num esforço conjunto para reduzir a exclusão social, melhorar o acesso à saúde, à educação, à habitação digna e à segurança alimentar.

A terminar, lançou um apelo inspirador: “Que possamos pensar que todos juntos possamos dar o nosso contributo para uma sociedade mais justa.”

Reforçando a ideia de que “temos esse poder nas nossas mãos de podermos ser catalisadores”, Licínia Freitas deixou uma mensagem de esperança e responsabilidade colectiva: “Que no futuro a pobreza seja apenas uma memória do passado. O momento de agir é agora”, concretizou.