
Os grandes derrotados da noite eleitoral foram Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua. Nos dias de hoje, a percepção de radicalismo de esquerda, mesmo quando infundada, é repelente de votos mais eficaz da política portuguesa.
Não é um problema exclusivo da esquerda. Por exemplo, a Iniciativa Liberal é um partido ideológico. Numa noite histórica para a direita, tem um crescimento percentual que, caso estivéssemos a falar do PIB, a própria IL apelidaria de estagnação. O Livre ganha votos, provavelmente porque Rui Tavares é visto como mais conciliador do que o líder do partido de centro-esquerda.
Pelos vistos, há um eleitorado que castiga os candidatos que apresentem uma visão do país diametralmente oposta a outras visões do país. Ou seja, valoriza os políticos que "só querem trabalhar" e que vão "acabar com a vergonha”. Para além disso, vota por neomarcelismo: o clássico "gosto muito de o ouvir a falar na televisão".
E, se o eleitorado quer, os partidos dão. O Partido Socialista sofreu uma derrota eleitoral, pelo que está concentrado em evitar desaire semelhante, optando por uma liderança mais moderada. A ideia é tentar encontrar, dentro das suas fileiras, o mais sensaborão dos centristas. Como se vê por todo o Mundo, este tipo de políticos aborrecidos tem tido imenso sucesso a combater os populismos.
Não é que a liderança de Pedro Nuno Santos tenha seguido um rumo muito diferente. A percepção de inveterado esquerdista foi formulada na sua ascensão interna no partido; como Secretário-Geral moderou-se, o que nunca resultou e sempre pareceu forçado. Para que o PS não se torne indistinguível do PSD, é possível que a próxima direcção do PS procure adoptar o modelo oposto, o de Joe Biden em 2020: apresentar ao eleitorado uma postura centrista, mas eventualmente governar mais à esquerda do que o expectável.
A questão é que Biden partiu para o combate de 2020 com várias vitórias eleitorais no currículo. Já o plano do PS parece ser substituir o derrotado nas legislativas pelo militante derrotado pelo derrotado nas legislativas, para que, assim que este segundo seja derrotado, venha o ex-presidente da Câmara de Lisboa que, meses antes do PS ter maioria absoluta nas legislativas, fora derrotado. Não é mudar de rota, é mudar de derrota.