A Agência Espacial Europeia (ESA) desligou hoje a sua sonda espacial Gaia depois de mais de uma década a recolher dados que estão agora a ser usados ​​para desvendar os segredos da nossa galáxia. Portugal esteve envolvido na missão desde o início, com um contributo significativo através doLIP – Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas.

No dia 27 de Março de 2025, a equipa de controlo do Gaia no Centro Europeu de Operações Espaciais da ESA desligou cuidadosamente os subsistemas da nave espacial e enviou-a para uma “órbita de retirada” em torno do Sol, revela a ESA em comunicado.

"Gaia transformou a nossa compreensão do cosmos"

Lançada em 2013, a missão Gaia "transformou a nossa compreensão do cosmos ao fazer com precisão o mapa das as posições, distâncias, movimentos e propriedades de quase dois mil milhões de estrelas e outros objetos celestes. Forneceu o maior e mais preciso mapa multidimensional da nossa galáxia alguma vez criado, revelando a sua estrutura e evolução com um detalhe sem precedentes".

ESA/Gaia/DPAC, Stefan Payne-Wardenaar

A missão revelou provas de fusões galácticas antigas, identificou novos aglomerados de estrelas, contribuiu para a descoberta de exoplanetas e deburacos negros, fez o mapa de milhões de quasares e galáxias e seguiu a trajetória de centenas de milhares de asteroides e cometas.

O (grande) contributo português

Portugal teve um papel pioneiro na missão Gaia, sendo a primeira missão científica espacial com envolvimento nacional desde a fase de definição, em 2006.

A equipa portuguesa, coordenada por André Moitinho (LIP e Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa), contribuiu em áreas como o controlo de qualidade dos dados, calibração astrométrica, reconstrução de imagens e otimização de parâmetros de observação

André Moitinho de Almeida criou o maior e mais exato mapa da Via Láctea e está a desenvolver um mapa tridimensional que nos guia pelo espaço e pelo tempo na imensidão da galáxia. Com impactos muito concretos como aumentar a precisão do sistema de GPS que usamos nas estradas.


"As naves espaciais não querem realmente ser desligadas”

Gaia excedeu em muito a sua vida útil planeada de cinco anos e as suas reservas de combustível estão a esgotar-se. A equipa de Gaia considerou cuidadosamente a melhor forma de eliminar a nave espacial de acordo com os esforços da ESA para eliminar de forma responsável as suas missões.

Os cientistas queriam encontrar uma forma de evitar que Gaia regressasse à sua antiga casa, perto do segundo ponto Lagrange (L2) do sistema Sol-Terra e minimizar qualquer potencial interferência com outras missões na região.

“Desligar uma nave espacial no final da sua missão parece uma tarefa bastante simples, mas as naves espaciais não querem realmente ser desligadas", afirma o Operador da Nave Espacial Gaia, Tiago Nogueira.

A 27 de março de 2025, os comandos finais foram enviados para a nave espacial Gaia da ESA pela sua equipa de controlo no Centro Europeu de Operações Espaciais da ESA em Darmstadt, Alemanha.
A 27 de março de 2025, os comandos finais foram enviados para a nave espacial Gaia da ESA pela sua equipa de controlo no Centro Europeu de Operações Espaciais da ESA em Darmstadt, Alemanha. ESA

Gaia foi concebida para resistir a tempestades de radiação, impactos de micrometeoritos ou perda de comunicação com a Terra. "Possui vários sistemas redundantes que garantiram que podia sempre reiniciar e retomar as operações em caso de interrupção".

Por isso os cientistas tiverem de conceber uma estratégia para ir desmontando e desativando as várias camadas de redundância que protegeram Gaia durante tanto tempo "porque não queremos que seja reativada no futuro e comece a transmitir novamente se os seus painéis solares encontrarem luz solar".

Dados de Gaia continuarão a alimentar estudos e descobertas

Embora as operações da nave espacial já tenham terminado, a exploração científica dos dados de Gaia apenas começou.

“Os extensos dados do Gaia são um tesouro único para a investigação astrofísica e influenciam quase todas as disciplinas da astronomia”, afirma o cientista do Projecto Gaia, Johannes Sahlmann. “A divulgação de dados 4, planeada para 2026 , e os catálogos finais do legado de Gaia, que serão lançados depois de 2030, continuarão a moldar a nossa compreensão científica do cosmos nas próximas décadas".

A bordo da sonda seguiu um tributo especial: os nomes de cerca de 1500 membros da equipa, incluindo portugueses, ficaram gravados para sempre como homenagem a uma missão que mudou a forma como olhamos o céu.