A Rússia, em guerra desde 2022, representa o maior sinal deste quadro. Apesar das sanções, a sua economia tem mostrado uma resiliência surpreendente, resultado da reorientação estratégica para Oriente, nomeadamente para China e Índia. Estas relações alimentam a sua indústria de guerra e sustentam o seu PIB, com as exportações de petróleo e gás a atingir valores recorde. Ainda assim, esta capacidade pode ser ilusória, uma vez que resulta de uma economia militarizada, em que bombas e mísseis explodem em solo ucraniano, substituindo investimentos em setores produtivos de longo prazo. O desemprego baixo é amplamente camuflado pela realidade da população ativa que ou desertou ou se mobilizou para o conflito.

A Ucrânia, alvo da invasão, também resiste. A sua economia, devastada no início da guerra, começou a reinventar-se. O PIB, embora reduzido em 25% logo na primeira fase do conflito, deverá ter crescido 4% em 2024, impulsionado pela inovação, pela ajuda ocidental e por exportações corajosas. O país conseguiu adaptar-se à guerra. A criação de corredores marítimos protegidos e o desenvolvimento de tecnologias para mapear a destruição são alguns exemplos do processo de reinvenção da economia ucraniana. Mas o futuro está longe de ser garantido. A falta de energia, de mão de obra e de financiamento ameaça agora severamente a estabilidade da Ucrânia, e a dependência de ajuda externa mantém o país muito vulnerável às alterações políticas internacionais. O regresso de Trump ao poder é uma incógnita. A probabilidade de reduzir drasticamente o suporte financeiro americano está longe de ser nula. Isso colocaria a Ucrânia numa posição altamente precária.

Ao mesmo tempo, no Ocidente, desenvolve-se um outro tipo de conflito. Simon Johnson, Nobel da Economia em 2024, já havia alertado para os riscos de bancos desproporcionadamente grandes, como o J.P. Morgan e o Goldman Sachs. Estes “megabancos” não só influenciam governos, como agravam desigualdades económicas. Em Portugal, por exemplo, os lucros diários da banca em 2024 atingiram níveis históricos, enquanto as famílias enfrentavam dificuldades crescentes devido à inflação e à subida das taxas de juro. Esta situação é emblemática de um sistema financeiro que privilegia excessivamente o lucro. O equilíbrio entre o lucro e o bem-estar social é fundamental para manter saudável o fluxo global da atividade económica.

A crescente influência da China, a resistência da Rússia o os desafios internos do Ocidente, incluindo a inflação e as pressões sociais, é o que nos deixa 2024.

A lição que o mundo herda de 2024 é clara e revela que o equilíbrio mundial é cada vez mais frágil. As decisões económicas, sejam tomadas no Kremlin, em Washington ou em Bruxelas, têm repercussões que atravessam fronteiras. O desafio reside em encontrar uma nova ordem mundial que mitigue os conflitos. Como o mundo está mais interligado do que nunca, a queda de uma peça pode desencadear um efeito dominó com consequências tão imprevisíveis quanto impactantes.

Professor Associado e Coordenador na Universidade Europeia