A inovação desempenha um papel fundamental na transformação da economia portuguesa, especialmente num contexto global marcado por mudanças tecnológicas, competitividade internacional crescente e uma necessidade urgente de incorporar sustentabilidade na gestão e na sociedade. No entanto, este processo de inovação traz tanto desafios significativos quanto oportunidades promissoras. Para entender a fundo a dinâmica da inovação na economia portuguesa, é necessário explorar a interação de vários fatores, incluindo o contexto histórico, a estrutura industrial e empresarial, as políticas públicas e o capital humano.
Historicamente, a economia portuguesa tem sido marcada por uma forte dependência de setores tradicionais, como a indústria têxtil, o turismo e a agricultura. Embora esses setores continuem a desempenhar um papel importante — e sem o turismo muito dificilmente a Marca Portugal teria a expansão global atual —, a necessidade de diversificação e modernização é necessária e evidente. A inovação em Portugal poderia e deve surgir como uma solução para reposicionar a economia, fomentando o desenvolvimento de setores emergentes, como a tecnologia, energias renováveis e biotecnologia. Devido ao nosso complexo de escala, o único caminho é a especialização, criando valor acrescentado por via do conhecimento e da produtividade.
A estrutura industrial de Portugal é composta predominantemente por pequenas e médias empresas (PME), que representam a maioria do tecido empresarial. As PME, no entanto, enfrentam desafios consideráveis para inovar, como limitações financeiras, falta de conhecimento técnico e escassez de recursos humanos qualificados. Apesar dessas dificuldades, Portugal tem investido em políticas públicas de incentivo à inovação, e o programa Portugal 2030, que visa aumentar o investimento em investigação e desenvolvimento (I&D), também promove a digitalização da economia e a internacionalização.
O capital humano é um fator determinante e crucial para a mudança de paradigma. Embora o país tenha feito progressos no aumento do número de licenciados em áreas STEM (ciências, tecnologia, engenharia e matemática), a fuga de cérebros e a escassez de mão-de-obra altamente qualificada são obstáculos significativos para o crescimento da inovação do tecido empresarial. A transformação digital e a economia verde apresentam oportunidades, mas será essencial que Portugal invista ainda mais na formação e retenção de talento, assim como no desenvolvimento de uma cultura empresarial mais orientada para o risco e para a inovação, tendo sempre como alinhamento os apoios para inovação e um sistema financeiro com alguma flexibilidade. Isto porque ao mesmo nível ainda existe muita falta de literacia financeira.
O diagnóstico dos desafios da inovação da económica portuguesa já foram identificados por inúmeras personalidades e instituições de renome internacional/nacional, mas é sempre importante relembrar a quem de direito algumas premissas importantes. A baixa produtividade e capacidade tecnológica instalada: de acordo com o Eurostat, Portugal tem uma produtividade de trabalho por hora inferior à média da União Europeia. Em 2022, Portugal apresentou apenas 67% da média europeia (fonte: + factos 2022 – Instituto + Liberdade), sendo que em 1995 rondava os 69%, o que não só reflete uma lacuna significativa de eficiência laboral como revela que fomos ultrapassados por outras economias europeias. Esse valor contrasta com países como a Eslovénia 82% e o benckmark França e Alemanha, que superam em larga escala (desafio a pesquisarem os valores). Em 2022, a despesa nacional em investigação e desenvolvimento situou-se em 1,70% do PIB, valor inferior ao desejável, isto porque a média da União Europeia ronda dos 2,20% — este indicador reflete o investimento limitado em inovação tecnológica. É necessário ambicionar mais e melhor nesta rubrica, caso contrário seremos os primeiros dos últimos, que é o nosso patamar atual.
Sobre a escassez de capital humano qualificado, que já referenciei acima, somente referir que, segundo o INE (2020), aproximadamente 30% dos jovens licenciados em Portugal em áreas estratégicas emigraram. Qual o custo para a economia nacional a médio-longo prazo? É verdade que Portugal está mais cosmopolita e está a atrair investimento de estrangeiros com uma visão contemporânea do mundo e isto poderá de uma forma holística ajudar a ver Portugal com outros olhos, mas o caminho ainda é longo porque a taxa de desemprego jovem é alta, a rondar os 20,3% entre 16 e os 24 anos (INE/2023).
Um dos maiores entraves à inovação em Portugal é sem dúvida a desigualdade regional. A inovação está fortemente concentrada nos grandes centros urbanos, apesar de alguns bons exemplos a nível nacional no empreendedorismo e inovação para contrariar a tendência, como Évora /Alentejo e Faro/Algarve. Segundo o Índice Regional de Competitividade (2022), as regiões de Lisboa e do Norte concentravam a maioria do investimento em inovação. Esta centralização resulta em disparidades regionais significativas, limitando o crescimento uniforme da inovação. Porventura, e partilho um desabafo (quase a ser um treinador de bancada), deveríamos de olhar para o modelo de cluster de valor acrescentado de Itália, onde a especialização criou um valor acrescentado nas PME, estratégia que possibilitou ao país ser dos principais fornecedores da Alemanha em algumas especialidades.
Um dos pilares da inovação em Portugal e na Europa será sem dúvida a sustentabilidade e a economia verde, ponderando sempre a capacidade do sistema em suportá-la — e ponderarmos a energia nuclear de nova geração. Tendo como pano de fundo o ano recorde de produção de energia de fonte renovável em 2023 a rondar os 60%, colocando Portugal entre os líderes do setor, demonstra a ambição e coragem de Portugal em reposicionar-se, sendo a meta 2030 significativa a nível de esforço de produção e na área da mobilidade elétrica, fomentando a economia circular e novas empresas especializadas no setor. Mas aqui gostava de compreender melhor por parte do governo central qual é a dimensão da visão para Sines e o hidrogénio verde e o seu enquadramento europeu de fornecimento; isto porque o conflito da Ucrânia revelou fragilidades e protecionismo que a sociedade porventura desconhecia a nível energético.
A digitalização da economia, porventura com a integração de IA, poderá ser um dos maiores catalisadores de Portugal, desde que exista na mesma medida uma desburocratização dos serviços públicos, sem necessidade de assinaturas presenciais, agilizando processos e fomentando nesta ótica uma verdadeira revolução. Segundo o índice de digitalidade da economia e sociedade (IDES), em 2022 Portugal estava na 16ª posição entre os países membros da União Europeia em termos de digitalização (nem tudo é cinzento, como pensamos; em Portugal é necessário mudar alguns estigmas). É verdade que o paradigma também está a mudar no que concerne a investimento de startups.
Segundo o Relatório de Startups Europeias de 2021, Lisboa e Porto estão entre as cidades europeias mais atrativas para startups, graças à combinação de baixo custo de vida, alta qualidade de vida e uma comunidade empresarial em expansão e instalada. Este alinhamento com o turismo e termos um Hub Tech Turístico poderá ser uma enorme oportunidade se fizermos benckmark com Espanha (ex: Palma de Maiorca).
Uma das maiores oportunidades de R&D e modernização do setor empresarial que possibilitará à economia reposicionar-se nos próximos 20 anos será sem dúvida o PRR e o Portugal 2030. Estamos a falar de uma grandeza de 12,6 mil milhões de euros para alavancar toda a economia e se os pilares estratégicos estiverem alinhados com a operacionalização dos planos de apoio, podemos ver um novo Portugal em dez anos, sendo que, se considerarmos a sua globalidade, o PRR terá uma capacitação de 16,64 mil milhões de euros e 24,18 mil milhões de euros ao abrigo do plano Portugal 2030. Estes incentivos financeiros criam um ambiente único à inovação e ao crescimento do setor empresarial, por via do investimento em infraestruturas tecnológicas, formação e investigação e desenvolvimento.
As estatísticas neste enquadramento reforçam porventura o que todos sentimos no mundo empresarial e o que sentem os que estão em contato com diversas indústrias e pessoas: que existem enormes desafios, mas também oportunidades no caminho da inovação em Portugal, como uma “verdade de la palice”. Apesar da baixa produtividade e do conservadorismo empresarial nacional, os indicadores de transformação digital e economia verde revelam potencial evidente para o crescimento, é verdade que hoje os termos startup e unicórnio estão na moda em Portugal, mas é preciso que o erro seja visto pela positiva e não como uma sentença de morte, caso o conceito empresarial não seja validado comercialmente/financeiramente. Basta comparar o mindset empresarial e de investimento entre EUA e Portugal/Europa.
Em suma, o futuro da inovação em Portugal dependerá, em grande parte, da capacidade de superar os desafios relacionados com a qualificação da mão-de-obra, o aumento da produtividade e a descentralização das oportunidades de inovação. Se bem-sucedido, o país poderá consolidar-se como um líder regional na Europa, tanto na transformação digital quanto na economia verde, abrindo caminho para um crescimento económico mais sustentável e competitivo possibilitando às novas gerações vislumbrarem um novo futuro.