Em que consiste este estudo-piloto?

Este estudo pretende avaliar a relevância da clínica das plaquetas com biomarcadores não invasivos em doentes com mieloma múltiplo. A base do estudo prende-se com vários aspetos, entre eles: a realização de avaliação medular (aspirado de medula e/ou biópsia óssea) para fazer o diagnóstico e avaliar o prognóstico, monitorizar a evolução da doença e a resposta à terapêutica dos doentes com mieloma, nomeadamente para avaliação de recidiva e/ou de refratariedade às terapêuticas instituídas.

No entanto, estas metodologias são relativamente invasivas. Além disso, o mieloma múltiplo é uma doença muito heterogénea, sob o ponto de vista biológico, clínico e de resposta à terapêutica, o que pode estar relacionado com a existência de vários clones de células de diferentes sensibilidades. Esta heterogeneidade clonal é difícil de avaliar no aspirado medular, pelo que a utilização de novas metodologias poderá ser de extrema relevância clínica .

Assim, recorremos às plaquetas, uma forma de biópsia líquida, que permite utilizar amostras de sangue periférico através de procedimentos não invasivos. As plaquetas são habitualmente conhecidas pelo seu papel na hemoestase, mas que efetivamente, pelas suas particularidades e funções, são capazes de captar ácidos nucleicos (RNA e microRNA) e outras moléculas (proteínas). Podem, por um lado, captar o que se passa nos tumores, e por outro também influenciar os tumores, daí a designação de ‘plaquetas educadas pelos tumores’ (TEP).

O que esperamos é que as plaquetas mimetizem o que se passa no tumor, neste caso nas células de mieloma, de modo a que a nível periférico possamos identificar e detetar precocemente a doença, através da identificação de perfis moleculares que possam caracterizar melhor o mieloma múltiplo e identificar biomarcadores para melhorar o diagnóstico e, sobretudo o prognóstico, a monitorização da evolução da doença, a resposta à terapêutica, a deteção de recidivas e de recaídas precoces, recorrendo a uma amostra de sangue periférico.

A diferença deste tipo de biópsia líquida relativamente a outras que já estão a ser mais estudadas, e algumas até já com alguma implementação prática, como seja o DNA circulante, ou as células tumorais circulantes, ou até mesmo as vesículas extracelulares, é que, de facto, as plaquetas são de fácil acesso e isolamento, existem em quantidade no sangue, e contêm RNA de melhor qualidade. No fundo, temos outra metodologia que poderá avaliar perifericamente o que se está a passar de uma forma dinâmica e em tempo real no doente.

“Eventualmente, com estes perfis, podemos até avaliar e identificar novos alvos terapêuticos, para além de novos biomarcadores que possam ser úteis para o diagnóstico, para o prognóstico, e para a avaliação de resposta terapêutica de uma forma mais precisa e individualizada.”

Este procedimento será apenas utilizado para o mieloma múltiplo, ou poderá ser aplicado noutro tipo de abordagens?

De facto, esta é uma pequena parte de outro projeto mais amplo, onde vamos testar a importância das plaquetas em alguns tumores de células B. Vamos começar com o mieloma múltiplo e depois também com o linfoma difuso de células B, mas isto pode ser utilizado para neoplasias sólidas (onde foi primeiramente estudado). Por isso, alguns colegas manifestaram interesse em utilizar esta metodologia em outros tumores, nomeadamente em melanomas. Mas de facto, a relevância das TEP está mais clara em tumores sólidos, em tumores hematológicos está muito menos estudado.

Nos casos de pessoas com défice de plaquetas, com valores não adequados. Esta metodologia pode ser aplicada em qualquer doente?

Pode ser em qualquer doente, mesmo nos doentes em tratamento e que possam ter trombocitopenia, por exemplo. Nas metodologias que vamos utilizar não precisamos de grande quantidade de amostra. De salientar que estamos a utilizar metodologias que depois sejam fáceis e transitáveis para a prática clínica. São tecnologias sensíveis que utilizam pouca amostra.

Quais as instituições que colaboraram para a realização deste estudo?

Este é um projeto de colaboração entre a Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, onde serão feitos a maior parte dos estudos de investigação, e o serviço de Hematologia do CHUC, do qual também faço parte, e ainda com a colaboração do departamento de Imunoterapia do Cancro da Universidade de Nottingham-Trent no Reino Unido.

CG

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