Há muitos anos que a necessidade de captar receitas de publicidade, cada vez mais direcionadas para as plataformas digitais, é uma das maiores preocupações partilhadas pelos detentores de média, e a problemática mantém-se. Foi o que sublinharam esta terça-feira os presidentes da Impresa (dona do Expresso e SIC), Media Capital (TVI e CNN Portugal), RTP e Medialivre (Now, Correio da Manhã e Jornal de Negócios), no painel "Debate do Estado da Nação", durante o 34.º congresso da APDC que arrancou esta terça-feira, na Culturgest, em Lisboa, com o mote “Negócio & Ciência a Trabalhar Juntos”.

"O principal problema [do sector dos média] são as receitas. Há muito tempo que a perda é efetiva", afirma Luís Santana, presidente executivo da Medialivre, que tem como acionista Cristiano Ronaldo, sintetizando um sentimento comum a todos os grupos presentes.

Francisco Pedro Balsemão, líder da Imprensa já tinha afirmado: "ainda estamos muito dependentes da publicidade", sublinhando no entanto que o “foco” do grupo que lidera "é diversificar a receita e a rentabilidade". É isso que têm estado a fazer com a aposta na plataforma streaming e nos podcast. "Estamos sujeitos a muitos a concorrentes, e muitas vezes desleais", afirmou ainda o presidente da Imprensa.

A este propósito Nicolau Santos, presidente da RTP, salientou que a televisão pública tem “as receitas congeladas” desde 2016, e que está limitado a seis minutos de publicidade por hora, contra os 12 minutos dos concorrentes. Uma justificação, disse, para a necessidade de “enxugar” a RTP e avançar para a reorganização em curso.

A reestruturação e as reorganizações nos grupos de média, nomeadamente na RTP, Imprensa e a Medialivre, foram tema do painel, com Nicolau Santos a admitir que a televisão pública deverá ter resultados "significativamente negativos" em 2025, depois de 15 anos de lucro, mas apontando para uma recuperação já em 2026.

"Estamos a tentar encontrar fontes alternativas de receita, mas temos muito de olhar para os custos", avançou Nicolau Santos. Explicando que o programa de rescisões voluntárias e o investimento de 15 milhões de euros vão impactar o resultado.

Francisco Pedro Balsemão passou em revista a reorganização do grupo, admitindo que a dívida da Impresa, já com 20 anos, apesar de ter sido reduzida a metade, ainda pesa sobre as contas. E a avançar que depois das recentes rescisões amigáveis, efetuadas já este ano, não estão previstas mais saídas.

Impresa aberta a novos acionistas

Questionado, o líder da Impresa deixou a porta aberta a que possa haver novos acionistas no grupo, salientando porém que isso a acontecer não será uma novidade. “Não estamos fechados à entrada de entidades ou pessoas de fora [do Grupo]. Se for uma relação win-win, não fechamos essa porta”, admitiu.

"Temos tido sempre ao longo da história do Grupo Impresa, com mais de 53 anos, acionistas. O período que vivemos neste momento [sem acionistas qualificados externos de relevo] é quase uma exceção", acrescentou. E enumerou: "no início da SIC tivemos a Globo, tivemos os suíços da Edipresse nas revistas”.. E também acionistas nacionais, como o Grupo Mello ou Porto Editora".

Proteção dos direitos de autor no digital, precisa-se

Pedro Morais Leitão, lembrando que o grupo Media Capital já esteve duas vezes à beira da falência e que por isso o foco da gestão sobre o equilíbrio das contas e estrutura é permanente, quer ver mais protegidos pelo Governo e o regulador os direitos de autor no digital.

"Estamos a assistir da nova vaga tecnológica da inteligência artificial [IA]", afirmou, apontando que está a travada uma guerra a nível global pelas várias plataformas de IA “com um desrespeito total pelos direitos de autor no digital”. Situação que cria uma “preocupação muito grande relativamente ao futuro”.

"Peço aqui ao regulador, ao Governo e a todos os agentes da sociedade que estejamos particularmente atentos porque o tempo de reação tem que ser mais rápido", alertou, citado pela Lusa.

Até porque "não podemos levar 20 anos a criar uma lei de proteção dos direitos de autor no digital. Neste momento tem que se agir rapidamente sobre o que existe", sublinhou.

Morais Leitão salientou que se está "a normalizar a utilização de conteúdos por órgãos de comunicação social pelas novas plataformas de inteligência artificial, a Google ameaçada pela OpenAI tornou regra a publicação de resultados completos", referiu.

"A partir do momento que os seus conteúdos são utilizados livremente pelas plataformas de inteligência artificial sem sequer dar hipótese de recuperar parte do investimento que foi feito na produção do conteúdo através da publicidade digital, obviamente o nosso futuro está ameaçado", continuou Pedro Morais Leitão.

Há duas semanas, disse, a BBC iniciou um processo contra a OpenAI pela utilização dos seus conteudos em IA e contra a Google nos motores de busca.

"Pedíamos quer à Comissão Europeia quer ao Governo em Portugal que tivesse particularmente atento para que, no que respeita à inteligência artificial, não tenhamos de tecer o mesmo longo caminho das pedras" em termos de criar uma lei, insistiu.