
Jorge Jesus, que sempre se desesperou com estórias de fair play, de certeza que nos últimos anos ainda encontrou motivos para reforçar o desdém por condutas dessa natureza. Pelo menos no âmbito financeiro. Os muitos milhões despejados pela Arábia Saudita no campeonato local fizeram de certeza JJ perder as poucas noções que tinha sobre uma apertada política de controlo dos gastos.
O treinador do Al-Nassr sabe que, em comparação com as verbas que lhe foram postas à disposição no Médio Oriente, o despesismo que marcou a temporada de regresso ao Benfica não reflete mais do que uma ninharia.
Há cinco anos, sob o patrocínio do desespero com que Luís Filipe Vieira (LFV) passava os cheques, Jesus gastou para cima de 100 milhões de euros, apostando muitas fichas na qualidade de atletas como Darwin Nuñez, Everton, Pedrinho, Luca Waldschmidt ou Julian Weigl. Nomes de intocável reputação mas que não contribuíram para a consagração coletiva, ficando ligados a uma das épocas mais decepcionantes face ao nível do investimento.
Claro que Rui Costa, na qualidade de administrador da SAD, não só acompanhou de perto a política de contratações em 2020/21 como guardou na memória o exemplo do seu presidente e futuro adversário para agora replicar em grande parte a estratégia de mercado que visa salvaguardar a pole position na corrida eleitoral.
As aquisições de Amar Dedic, Rafael Obrador, Enzo Barrenechea (taxa de empréstimo até 2026), Richard Ríos e quiçá João Félix, quando falta mais de um mês para fechar a janela de transferências, mostram a extrema generosidade do líder benfiquista, disposto a colocar vários zeros à direita para oferecer a Bruno Lage experimentadas condições para atacar os dois importantes objetivos desportivos a curto prazo (Supertaça e qualificação para a fase de elite da Champions) e o supremo objetivo agendado para 25 de outubro, quando os sócios forem chamados às urnas.
Se for levado em linha de conta o facto de os vice-campeões nacionais terem ativado por 9 milhões a cláusula de compra do passe de Samuel Dahl, a circunstância de Barrenechea representar um custo adicional de 12 milhões no próximo verão e estar de pé a necessidade de encontrar uma alternativa sólida para o ponta de lança Pavlidis, tudo leva a crer que o reforço do plantel 2025/26 pode igualmente ultrapassar a barreira dos 100 milhões.
Pode ser este o preço da cadeira que neste momento pertence a Rui Costa e que além de LFV vai ser disputada por candidatos com os argumentos de João Diogo Manteigas, João Noronha Lopes, Martim Mayer e Cristóvão Carvalho.
A AMEAÇA DA GERINGONÇA
Talvez por recear uma gerigonça inventada por uma oposição superfragmentada na atualidade, o antigo delfim de Vieira, além do charme espalhado pela tesouraria da Luz e pelas videochamadas com destino a São Paulo, não se tem
poupado a esforços para retocar de forma substancial o edifício encarnado, com incidência no departamento de futebol.
Lourenço Coelho, ex-diretor geral, foi substituído por Mário Branco, o diretor desportivo Rui Pedro Braz cessará funções à entrada para o quarto trimestre do ano, Simão Sabrosa abandonou as Relações Internacionais e assume a Direção Técnica, enquanto na área da comunicação Ricardo Lemos entregou a pasta a Gonçalo Guimarães, a partir de ontem o profissional mais próximo do treinador na relação com os media.
E não é tudo. Segundo o anunciado ontem por... João Diogo Manteigas, o maior “reforço” pode ser o “Benfica Masterplan”, nome escolhido para traduzir o arrojado projeto de remodelação de todo o complexo desportivo, capaz de rivalizar com o futurismo saudita e garantir milhares de votos. Caso esta informação seja confirmada esta semana, Rui Costa, mais do que nunca, confundir-se-á com aquele dirigente autárquico que de repente acordou para o mundo real e só pensa nos métodos capazes de assegurar a reeleição no tão aguardado 12 de outubro.
Ao estilo do edil que guarda para o fim as prendas que os cofres ainda podem proporcionar, o antigo Maestro, a três meses do sufrágio, promete uma equipa capaz de resolver qualquer espécie de problema e muda os pilares da estrutura executiva. Não há limites para gastos, indemnizações ou salários e a única obrigação é permanecer no poder.
Os que correm por fora têm de se sujeitar. Pelo menos sabem de antemão que, à semelhança do que Luís Filipe Vieira demonstrou com Jorge Jesus, também o atual presidente assina com a mão do desespero.
Quem reforce o desdém por isso aproveitaria melhor o tempo em desencantar outras promessas sem fair play.