Rúben Amorim pensou e construiu uma máquina competitiva perfeita. Ataca por todo o lado, não é repetitiva, confunde e golpeia.
No futebol, os ciclos são instáveis e as verdades absolutas rapidamente estilhaçadas. Mas não há como dizê-lo de outra forma: nesta altura da época, o Sporting é imparável - e não será fácil conseguir bloqueá-lo nos próximos tempo.
O Estoril Praia tentou, é verdade, mas aqueles 25 minutos de 0-0 no score mais pareceram uma luta do eterno Macgyver contra uma bomba armadilhada. Todos sabíamos que o leão ia ser bem sucedido, só não sabíamos onde e quando.
A palete criativa dos campeões nacionais é interminável.
Se o bloco baixo do oponente protege a profundidade, então o espaço entrelinhas revela-se o seu corredor da morte; se o adversário se estende um pouco mais, então sabe-se que pelos corredores o desequilíbrio vai surgir.
Mais do que a analogia do cobertor, que cobre a cabeça e descobre os pés, à noite deste Estoril deve aplicar-se a imagem de um sentinela desorientado. E no meio da ponte.
O perigo chegou de todo o lado e de todas as formas. Um 0-3 mais do que natural.
A bússola de Matheus, o pé esquerdo de Geny
Bola nos pés de Morita ou Hjulmand, sinais de alerta ligados do lado canarinho. O Estoril até nem esteve apático no jogo, tentou sempre qualquer coisa, mas o Sporting foi demasiado forte. E até cruel.
Ameaçou pela esquerda (muito bem, Maxi Araújo), amassou pelo centro (Gyokeres, claro) e acabou a aniquilar a resistência amarela pela direita. Ainda por cima, veja-se bem, num lance inventado por Matheus Reis. Surpresa, surpresa.
O central esquerdino está confiante, ganhou com classe e descobriu Geny Catamo soltinho da vida - Wagner Pina, que o devia estar a marcar, encontrava-se caído e a queixar-se de falta. O pé esquerdo do moçambicano fez o resto.
O Estoril lá tentava levantar a voz, fazer-se ouvir de qualquer forma, e logo o Sporting o silenciava. Fortíssimo na reação à perda, fisicamente portentoso, o conjunto de Amorim foi apagando os pequenos sinais de rebelião e depois o talento decidiu.
Ainda antes do intervalo, e com uma posse de bola a rondar os 75 por cento (!), o líder da I Liga chegou ao 2-0. Francisco Trincão, em período de excelência e inspiração, serviu Morita para o golo - minutos antes dele próprio atirar a bola ao poste direito de Joel Robles.
Uma avalanche de bom futebol e de bom gosto. É impossível ficar indiferente à engenhoca mortífera criada por Rúben Amorim.
Gerir e pensar em Eindhoven
O avançar dos minutos coincidiu com as mexidas do lado leonino e o crescimento do Estoril. Um crescimento, ainda assim, bastante tímido e controlado com alguma facilidade pelo Sporting.
Na terça-feira há jogo em Eindhoven, para a Champions, e naturalmente há também músculos e cabeças a exigirem uma boa gestão.
Sem surpresa, Amorim fez recolher Maxi, Matheus e Hjulmand aos balneários com mais de meia-hora por jogar - avançaram Bragança, Inácio e Harder.
O Sporting não voltou a ser o mesmo, embora também não tivesse necessidade de sê-lo. Houve momento de um jogo mais partido, com mais espaço para os dois lados e algumas aproximações às balizas.
Pouco, muito pouco ainda assim para o Estoril de Ian Cathro; suficiente, mais do que suficiente para os de Alvalade. Daniel Bragança, de pé esquerdo e a contar com uma simpatia de Robles, encerrou a contagem.
Insistimos: a imagem deixada até ao intervalo, principalmente aí, comprovou cientificamente a existência de vida especial neste Sporting 24/25.
Tão forte a reagir à posse de bola do Estoril, como a saber o que fazer com ela. De todas as formas e feitios, por todo os pedaços de terreno, um leão incontrolável.
Exterminador e implacável. Uma masterpiece laboriosamente criada por mister Amorim.