Fui participante ativo no 1.º Congresso Nacional de Saúde e Ambiente, que ocorreu em Lisboa, nos dias 7 e 8 de fevereiro. Comigo estiveram 1000 inscritos, de 50 profissões ligadas à Saúde, representando cerca de 100 instituições, reunidas no Conselho Nacional de Saúde e Ambiente.

Numa sexta-feira chuvosa e num sábado solarengo, não esperava ver tantas pessoas a encherem as salas até ao fim dos dois dias. Ninguém arredou pé! Pelo menos desta vez, o que interessava aos congressistas era a discussão apaixonada da Saúde Global, em vez da espuma dos dias, habitual, da longa espera nas urgências.

A conferência final, da Dr.ª Manuela Neira da OMS, ficou-me na memória pela assertividade, clarividência e visão estratégica, para convencer os negacionistas do aquecimento do planeta. Em vez de tentarmos discutir as crenças, como se duma religião se tratasse, os nossos argumentos deverão converter as ações de preservação da Terra, em ganhos de saúde mensuráveis (mortalidade, anos de vida saudável após os 65 anos, etc.). Falar pela positiva, em vez de alardear catástrofes, resulta em ganhar mais adeptos para a causa da defesa do ambiente.

No “2019 Report Of The Lancet Countdown on Health and Climate Change”, o setor da Saúde é responsável por 4-6% das emissões com efeito de estufa. Uma criança nascida hoje vai ter um mundo com mais 4ºC do que na era pré-industrial. As crianças são mais sensíveis à doença diarreica e à dengue. A população com mais de 65 anos é mais suscetível aos efeitos das mudanças do clima e às ondas de calor. A exposição ao calor leva ao aumento do AVC, da doença respiratória, da insuficiência cardíaca, da insuficiência renal e também da violência interpessoal. O aumento da temperatura favorece o crescimento e a transmissão dos agentes microbiológicos patogénicos.

A diarreia infeciosa pode ser causada por um grande número de micro-organismos (salmonela, sigela, víbrio cólera, rotavírus), que crescem com temperaturas mais altas e alto grau de humidade. A malária, a diarreia infeciosa e a cólera causam mais de 3 milhões de mortes por ano. Está demonstrado, que cada súbita de 1ºC aumenta o risco de diarreia infeciosa não vírica de 1,7X.

As Infeções mais influenciadas pelas variações climáticas são a cólera, a fasciolíase e a doença de Lyme. Por outro lado, é chocante que 17% dos alimentos disponíveis no mundo virão a ser desperdício, que se fosse um País seria o 3.º maior emissor de gases com efeito de estufa! O aumento da temperatura, favorece o desenvolvimento do patogéneo e do vetor, podendo levar à duplicação dos ciclos de transmissão. A precipitação abundante, com o aparecimento de charcos de água estagnada, favorece a eclosão dos mosquitos vetores da transmissão de doenças. A expansão dos vetores aponta para o aumento da incidência de malária, dengue, chikungunya e leishmânia.

No 1.º CNSA aprendi muito com os veterinários, que explicaram o quanto a saúde dos animais influência a saúde dos homens. A diversidade das espécies, cada dia mais ameaçada, é uma defesa importante contra os surtos epidémicos e eclosão de novas doenças.

Com os gestores aprendi que se pode poupar a médio prazo, quando se investe na implementação de medidas de economia verde. Elas incluem a poupança de energia do edificado (painéis solares, lâmpadas LED), a redução das deslocações dos doentes (10% da pegada de carbono na saúde é dos transportes), a reciclagem certificada de material clínico, a partilha da informação clínica (evitando a duplicação de exames) e a otimização do consumo energético dos aparelhos mais gastadores (ressonância magnética nuclear p.ex.). Por outro lado, era bom que o financiamento da Saúde não se baseasse apenas na produção, mas também na avaliação de resultados. Evitar-se-iam muitos tratamentos e cirurgias inúteis, o que era um ganho na qualidade assistencial e ótimo para o ambiente!

As empresas farmacêuticas mostraram-se preocupadas com a sua pegada de carbono, tendo os inaladores como exemplo, e deram-nos a novidade de irem introduzir no mercado outras soluções, com a mesma eficácia terapêutica e 40% mais “verdes”.

A situação de degradação climática global obriga a que cada um de nós faça a sua parte. O setor da saúde não deve esquecer a sua responsabilidade, não só porque 5% do aquecimento é uma cifra relevante, mas também porque as boas práticas ambientais têm uma repercussão muito positiva na sobrevida e no tempo de vida saudável das pessoas. O grande problema é que é preciso investimento, e o resultado não é visível a curto prazo.

Ultrapassa os apertados ciclos eleitorais, e são raros os políticos de vistas largas!

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