Considerado o ‘protagonista’ da noite pelas polémicas demolições de construções ilegais no Talude Militar, em Loures, Ricardo Leão foi o primeiro a usar da palavra no debate da Cimeira da Grande Lisboa, esta terça-feira. “Já fiz, neste mandato, 250 demolições. Não venham com essa história de que é em eleições autárquicas que estou a fazer demolições”, respondeu.

No evento organizado pela SIC Notícias, o presidente da Câmara Municipal de Loures, que tem evitado os jornalistas desde o início deste processo, apresentou uma defesa essencialmente baseada em três linhas de argumentação para isentar a autarquia de qualquer responsabilidade e mostrar-se indignado.

O primeiro culpado identificado por Ricardo Leão é uma pessoa - que estará, segundo o próprio, identificada nas denúncias recebidas pela autarquia – que alegadamente vendeu “barracos” naquele local a outros moradores por valores que oscilam entre os €2.000 e €3.000. “A câmara já fez uma denúncia ao Ministério Público porque se estão a comercializar barracas naquele bairro. Há moradores a denunciar que pagaram €2.000 pela barraca com o sonho de que viriam a ter uma casa”, acusou, empenhando um papel com a denúncia feita pelo município.

O segundo responsável será o Movimento Vida Justa que “está a prejudicar as pessoas”, que alegadamente as terá aconselhado a recusar conversações com os responsáveis da câmara. “O Movimento Vida Justa, que entrou naquele bairro, na minha opinião está a prejudicar as pessoas”, afirmou, dizendo que a câmara tentou apoiar os moradores desde março. Sobre as soluções oferecidas pela autarquia, Ricardo Leão respondeu que “são as soluções que apresentámos agora” e sublinhou que as pessoas só estão “na rua porque querem”. “Dormem ao relento no bairro porque querem. A Câmara Municipal de Loures assegura todo o apoio social para que não durmam na rua”, insistiu.

Em resposta, poucos minutos depois destas declarações, o Movimento Vida Justa garantiu que “o presidente da Câmara Municipal de Loures está a mentir com todos os dentes”. “Os moradores entregaram uma carta que pedia uma reunião com o presidente da CM de Loures, assinada por 109 moradores, que até agora o Ricardo Leão não respondeu”, respondeu, ontem à noite, Flávio Almada, representante do grupo.

A terceira linha de defesa de Ricardo Leão passa por atribuir responsabilidade à anterior gestão da autarquia, então liderada pela CDU, que o presidente diz não ter deixado nenhum projeto de candidatura ao Plano de Recuperação e Resiliência no âmbito da habitação. “Eu, tristemente, cheguei câmara [em 2021] após oito anos de gestão da CDU e sabe quantos projetos de candidatura havia ao PRR para habitação? Zero. E tive de correr contra o prejuízo e contra o tempo”, disse. O autarca diz ter “uma estratégia local de habitação bem definida” em que está previsto, com apoio do PRR, “atribuir, em março, 300 casas”.

Na Cimeira da Grande Lisboa, que juntou os presidentes das câmaras de Lisboa, Loures, Oeiras, Sintra, Almada e o vice-presidente de Cascais, estiveram três temas em debate: a habitação, a segurança e os transportes. Conheça, abaixo, as principais conclusões do evento da SIC Notícias, com apoio da ACIN e a que o Expresso se associou.

Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e da Habitação, defendeu ser preciso apostar no encurtamento da distância entre os diferentes municípios da Área Metropolitana de Lisboa para se conseguir reduzir também a desigualdade social na região.
Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e da Habitação, defendeu ser preciso apostar no encurtamento da distância entre os diferentes municípios da Área Metropolitana de Lisboa para se conseguir reduzir também a desigualdade social na região. Nuno Fox

Habitação: não há uma solução mágica

  • Todos os autarcas defendem mais habitação pública, mas as respostas ao desafio não são consensuais. Há quem, como Isaltino Morais (Oeiras) e Inês de Medeiros (Almada), defenda que a resposta não está nas parcerias público-privadas, mas na aceleração de processos e desburocratização, enquanto outros, como Carlos Moedas (Lisboa) e Nuno Piteira Lopes (Cascais), veem nos privados parte da solução.
  • “Não há solução sem mais stock de habitação pública”, considerou o ministro da Habitação e das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, na sessão de abertura da cimeira. Basílio Horta (Sintra) alerta que “é urgente uma política coordenada” entre todos os intervenientes.

  • Há iniciativas locais em curso que, reconhecem os autarcas, são insuficientes. Os municípios estão a lançar centenas ou milhares de novos fogos, mas reconhecem que a escala do problema exige uma resposta nacional de longo prazo. “Temos de fazer um programa a 15 ou 20 anos”, sugere Isaltino Morais.

Além de Ricardo Leão (Loures), Carlos Moedas (Lisboa) e Basílio Horta (Sintra), participaram nos debates Isaltino Morais (Oeiras), Inês de Medeiros (Almada) e Nuno Piteira Lopes (Cascais)
Além de Ricardo Leão (Loures), Carlos Moedas (Lisboa) e Basílio Horta (Sintra), participaram nos debates Isaltino Morais (Oeiras), Inês de Medeiros (Almada) e Nuno Piteira Lopes (Cascais) Nuno Fox

Segurança: entre os factos e as perceções

  • Criminalidade geral desceu, enquanto a violência doméstica é uma tendência em crescimento em todos os municípios. Maioria dos autarcas diz ser preciso reforçar policiamento de proximidade e recursos atribuídos às forças policiais, com Moedas a dizer que a Polícia Municipal precisa de mais autonomia. “Em 2010, havia 10 mil PSP em Lisboa, hoje há 6700”, apontou.
  • Perceção de segurança é tão importante como os dados, consideram autarcas como Ricardo Leão. Isaltino Morais rejeita alarmismos e defende que “a polícia dá perceção de segurança, mas não é o único caminho”. Basílio Horta diz ser preciso ter em conta a perspetiva dos munícipes, mas “sem alarmar”.

Transportes: articulação na área metropolitana é crucial

  • Representantes das autarquias concordam que é preciso existir liderança e um projeto comum para os transportes na Área Metropolitana de Lisboa, que precisa de respostas integradas. Nova travessia sobre o Tejo, túnel entre as margens Sul e Norte ou expansão do metro para Loures devem ser prioridades, defendem.
  • “Não há política de mobilidade só no nosso canto”, diz Inês de Medeiros, que pede mais ferrovia e reforço do transporte público fluvial.
  • É, porém, consensual que a criação dos Transportes Metropolitanos de Lisboa e da Carris Metropolitana, assim como o alargamento do passe Navegante, foram projetos “revolucionários” que devem ser mantidos e alargados.

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