O secretário de Estado norte-americano terminou o périplo pelo Médio Oriente sem o almejado acordo para um cessar-fogo na Faixa de Gaza. O acordo parece agora tão distante como antes da sua chegada, uma vez que a última proposta apresentada pelos EUA, e aprovada por Israel, atende a novas exigências do Governo de Telavive, designadamente a implementação de um cessar-fogo temporário e não permanente, a omissão de uma retirada parcial ou total das forças israelitas de Gaza e a presença israelita em territórios como a junção de Netzarim, a passagem de Rafah e o corredor de Filadélfia.

O texto em questão, que foi imediatamente rejeitado pelo Hamas, tem suscitado algumas dúvidas entre os países mediadores, que adiaram a próxima ronda negocial, agendada para quinta-feira no Cairo, para “uma data não especificada”, segundo uma fonte próxima do processo citada pela agência noticiosa Efe.

Não foi apresentada uma justificação oficial para a decisão, mas altos responsáveis dos países mediadores deram a entender que os novos termos indicados por Israel estão na origem do mais recente impasse. Em declarações ao jornal ‘Haaretz’, um destes funcionários afirmou que não faz sentido realizar outra reunião de alto nível no Cairo “a não ser que os EUA pressionem Netanyahu a desistir das suas novas exigências e alterem a sua proposta de transição em conformidade”.

Outras fontes que falaram ao diário israelita consideram que o primeiro-ministro está “mais uma vez a sabotar as conversações” e descrevem a concordância demonstrada perante Antony Blinken, na segunda-feira, como “uma exceção”. “As suas declarações na terça-feira no fórum [de familiares de reféns] foram, para ele um regresso à rotina.”

Paralelamente, responsáveis egípcios exprimiram a sua descrença na concretização de um acordo entre Israel e o Hamas, uma vez que o grupo islamita palestiniano dificilmente concordará com a proposta atual.

“Os americanos estão a oferecer promessas, não garantias”, comentou um alto funcionário egípcio em entrevista à The Associated Press (AP), aludindo à execução da primeira fase do acordo, que determina a libertação dos reféns mais vulneráveis por parte do Hamas enquanto se negoceiam a segunda e terceira fases, sem salvaguardas para o movimento por parte de Israel ou dos mediadores.

Da mesma forma, acrescentou, o texto não é taxativo quanto à retirada de Israel do corredor de Filadélfia e da junção de Netzarim. Em vez disso, contém “promessas” de uma redução das forças israelitas nesses territórios. “Isto não é aceitável para nós nem para o Hamas”, frisou.

Um outro responsável do Egito, mediador que é também parte afetada pois faz fronteira com Gaza, reconheceu que é improvável que seja alcançado um acordo, já que Israel recusa comprometer-se com uma saída total de Gaza na segunda fase. Sem essa retirada da zona fronteiriça e do corredor de Filadélfia, o Egito não reabrirá a passagem de Rafah, segundo disse aos EUA.

Esta quarta-feira, o Presidente norte-americano telefonou a Netanyahu para escalar a pressão diplomática e instar o chefe do Governo israelita a flexibilizar a sua posição em relação ao acordo, revelaram o Axios e a AP, citando fontes anónimas com conhecimento da conversa telefónica.

A chamada de Joe Biden e Netanyahu foi acompanhada pela vice-presidente e candidata presidencial Kamala Harris, indicou a Casa Branca, remetendo mais detalhes para um comunicado a divulgar mais tarde.

Os esforços diplomáticos têm sido intensificados nas últimas semanas devido ao agudizar das tensões na região com os assassinatos de líderes do Hamas e do grupo xiita libanês Hezbollah por Israel, e as ameaças de retaliação por parte do Irão, que fazem temer um conflito regional.

Outras notícias que marcaram o dia:

As forças israelitas estão a fazer encolher cada vez mais as zonas humanitárias no centro e no sul de Gaza. As tropas de Telavive emitiram uma nova ordem de evacuação para Deir-al-Balah, localidade no centro do enclave palestiniano que tem acolhido muitos deslocados, sobretudo após a incursão em Rafah em maio. Segundo a Al Jazeera, a cidade alberga, atualmente, cerca de um milhão de refugiados, e tem grande parte das suas redes de abastecimento de água e saneamento básico destruídas. A sul, em al-Mawasi, há cerca de 30 mil pessoas por cada quilómetro quadrado, enquanto “antes da guerra, havia apenas 1.200 por quilómetro quadrado”, segundo a UNRWA (Agência da ONU para os Refugiados Palestinianos). De acordo com o gabinete de comunicação do Governo de Gaza, citado pela Al Jazeera, Israel está a confinar os palestinianos num espaço que “não excede um décimo” do território de Gaza.

⇒ Benjamin Netanyahu esteve numa base aérea perto da fronteira com o Líbano, onde foi posto a par das capacidades militares israelitas e das medidas que estão a ser implementadas para preparar o país contra um possível ataque. “Estamos preparados para qualquer cenário, tanto ofensivo como defensivo”, declarou, de acordo com um comunicado do seu gabinete citado pela Lusa. Recorde-se que a tensão entre os dois países tem aumentado desde o 7 de outubro e, particularmente, desde a morte do do líder militar do Hezbollah num ataque de Israel a 30 de julho.

⇒ Israel realizou um “ataque aéreo” no sul do Líbano que matou um dirigente das Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, o braço armado da Fatah, o partido do presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmud Abbas, noticiou a Lusa. É a primeira vez em dez meses de fogo cruzado entre Israel e o Hezbollah que é confirmada a morte de um membro do partido de Abbas.