
Saiu fumo branco de um dos maiores confins do progresso. A Ministra da Saúde francesa, Catherine Vautrin, garantiu ao mundo que, finalmente, “uma geração sem fumo é possível e começa agora”. Agora foi a 1 de julho. Se quer fumar, fume em casa, na marquise ou num beco sem saída. Onde quer que as crianças estejam a salvo.
Ficam de fora as esplanadas de cafés e bares, mas só por enquanto, porque, assegura a Aiatolá francesa: não vai parar "por nada no futuro". Traduzo, leitor: o aperfeiçoamento do ser humano, hoje vil, sujo e a cheirar a tabaco, é possível. É já amanhã, quando esse cantar.
Até lá, e por ele, nada de cigarros nas praias, nos parques, nos jardins, em paragens de autocarros, perto de escolas. Acabará a rebeldia juvenil das duas passas ao intervalo de físico-química; cessará o swing de professores viciados no mal, à porta de cada escola lá do burgo. A sujidade varrer-se-á para longe.
Os fumadores cumprirão a sua pena: o esconderijo. Do outro lado do jardim, a 300 metros, por que não numa jaula para onde os seres cumpridores da saúde e da perfeição atirarão cascas de noz. Como macaquinhos; nunca a ser imitados. Ao invés, atirados para a selva de onde saiu o que lhes maltrata os pulmões.
Ao que parece, após tantos anos de cintilante progresso, há quem, ao contrário de mim, ainda fume. Quem, como Oliver Cromwell, Lord Protector inglês, não resista a uma fumarada e uma cerveja. Gostam. Por gosto ou por vício, gostam. É o que dizem.
Por isso fumam, sabendo que faz mal. Tomam essa decisão. Sabem dos prós e contras, e colocam mais peso sobre os primeiros. Os prós, quase sempre, são no singular. Um só: a sua vontade. Essa que, também eles sabem, colide com a multidão que não fuma. Que despreza o fumo, a sua substância, o seu cheiro; o que simboliza.
A morte, a devassa e uma nuvem de antigamente. De bares onde se procuravam caras entre as sombras de Marlboro e o barulho das bolas de snooker. De filmes da outra senhora Lauren Bacall e detetives. Tempos de doença e devassa. Excesso. Tudo ao contrário do homem novo.
Esse que, para certos legisladores, é possível. E praticável: quem não se submete ao trono da saúde pública terá a vergonha do gueto. Do olhar de lado; do estrangulamento progressivo até os pulmões e as mentes torturadas enxergarem o todo poderoso bem.
Tudo isto dito por eles, e imposto. Como Cromwell, Lord Protector, os percursores de uma “geração sem fumo” protegem a sua visão virtuosa contra quem lhe é obstáculo. Uma visão de saúde para um mundo a cores, contra quem diz proteger uma liberdade a preto e branco e em cópia maltratada.
Pois bem, Senhora Vautrin: eu fico com os segundos.