"Consideramos esta decisão não apenas justa, mas histórica. É um sinal claro de que a violência policial não fica impune. É, sobretudo, uma vitória para Cláudia Simões mas, também, uma mensagem para todas as vítimas de violência policial de que podem confiar nos nossos tribunais", defenderam as advogadas Leonor Caldeira e Luísa Teixeira da Mota, em nota enviada à Lusa.

O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) reverteu parcialmente a decisão da primeira instância, que absolvia o agente da PSP Carlos Canha das agressões a Cláudia Simões, condenando-o em cúmulo jurídico a uma pena suspensa de cinco anos de prisão.

A decisão foi hoje anunciada por este tribunal em comunicado, que condenou ainda o agente da PSP ao pagamento de uma indemnização de seis mil euros a Cláudia Simões, o que tem que ser concretizado no prazo de dois anos e seis meses.

O TRL considerou provado, com recurso a prova testemunhal e a imagens de vídeo, que Cláudia Simões foi agredida no interior da viatura da PSP pelo agente Carlos Canha, "o que foi feito na presença e perante a inação dos coarguidos agentes da PSP, Fernando Rodrigues e João Gouveia".

"Esta decisão repõe a verdade e repara uma grave injustiça: o Tribunal da Relação reconheceu que as lesões corporais sofridas por Cláudia Simões, cujas imagens indignaram o país e a diáspora, foram infligidas por agentes do Estado --- e não, como injustamente concluiu o tribunal de primeira instância, auto-infligidas", afirmaram as advogadas.

Assinalam ainda que o TRL condenou os três agentes e o Estado português ao pagamento de indemnizações que totalizam um montante de 22.750 euros, por danos patrimoniais e morais.

A Lusa contactou Fátima de Oliveira Esteves, advogada do agente Carlos Canha, que não quis prestar declarações sobre a decisão do TRL.

Com a decisão de hoje, o agente Carlos Canha passou a estar condenado numa pena única, em cúmulo jurídico, de cinco anos de prisão, suspensa por igual período, para além das indemnizações a Cláudia Simões.

A condenação hoje decidida, por agressão a Cláudia Simões, junta-se à da primeira instância, que o condenou a três anos de prisão, com pena suspensa, por dois crimes de ofensa à integridade física e dois crimes de sequestro relativamente aos cidadãos Quintino Gomes e Ricardo Botelho, que tinham sido levados para a esquadra.

Os agentes João Gouveia e Fernando Rodrigues foram ainda condenados, cada um deles, por um crime de abuso de poder a um ano e seis meses de prisão, suspensa por igual período, e subordinada ao pagamento de uma indemnização, por cada um destes agentes, de mil euros a Cláudia Simões no prazo de nove meses.

A 01 de julho de 2024 o tribunal de Sintra condenou Cláudia Simões por morder o agente da PSP Carlos Canha, enquanto o polícia foi absolvido das acusações de agressão na detenção desta mulher, mas condenado por agredir outras duas pessoas na esquadra.

Os agentes Fernando Rodrigues e João Gouveia foram absolvidos do crime de abuso de poder, com o tribunal a entender que os dois polícias que foram chamados à ocorrência na Amadora não atuaram à margem da lei no exercício das suas funções.

A juíza Catarina Pires excluiu que a atuação dos agentes e detenção de Cláudia Simões tenha sido motivada por racismo.

Os factos remontam a 19 de janeiro de 2020, quando Cláudia Simões, cozinheira de profissão, se envolveu numa discussão entre passageiros e o motorista de um autocarro da empresa Vimeca, pelo facto de a sua filha, à data com 8 anos, se ter esquecido do passe.

Chegados ao destino, o motorista decidiu chamar a polícia e, após alguns momentos de tensão, o agente Carlos Canha decidiu imobilizar Cláudia Simões, junto à paragem do autocarro, após esta se recusar a ser identificada.

Carlos Canha foi acusado de três crimes de ofensa à integridade física qualificada, três de sequestro agravado, um de injúria agravada e um de abuso de poder, enquanto os agentes João Gouveia e Fernando Rodrigues respondiam por um crime de abuso de poder, por não terem atuado para impedir as alegadas agressões do colega. Cláudia Simões foi acusada de um crime de ofensa à integridade qualificada.

IMA // ZO

Lusa/fim