O Dalai-lama afirmou esta quarta-feira que a instituição espiritual que lidera há mais de oito décadas "continuará após a sua morte" e que o processo de escolha do seu sucessor será feito "de acordo com a tradição budista tibetana", afastando a hipótese de extinguir o cargo, como chegou a admitir no passado.

Numa declaração gravada transmitida durante cerimónias de oração que antecedem o seu 90º aniversário, celebrado no domingo, o líder espiritual e Nobel da Paz indicou que a busca pelo próximo Dalai-lama deverá seguir os rituais estabelecidos desde a criação da instituição, em 1587.

"O próximo Dalai-lama deverá ser encontrado e reconhecido segundo a tradição do passado. A instituição do Dalai-lama continuará", afirmou Tenzin Gyatso, o 14º Dalai-lama, numa mensagem lida também à margem de uma conferência que decorre em Dharamshala, norte da Índia, com a presença dos mais altos lamas das diferentes escolas do budismo tibetano.

A afirmação surge após anos de especulação em torno da possível extinção da linhagem espiritual, alimentada por declarações anteriores do próprio Dalai-lama, que admitiu poder vir a ser o último a ocupar o cargo.

Altos lamas tibetanos reúnem-se para discutir sucessão

O líder espiritual fugiu do Tibete em 1959, após uma revolta esmagada pelas tropas chinesas em Lhasa, e vive desde então no exílio em Dharamshala. A tradição budista tibetana sustenta que o Dalai-lama pode escolher o corpo no qual será reencarnado - algo que, segundo o líder, acontecerá "fora da China", desafiando diretamente as autoridades chinesas, que insistem que apenas Pequim tem legitimidade para reconhecer a reencarnação.

Os mais altos lamas das diferentes escolas do budismo tibetano iniciam esta quarta-feira, em Dharamshala, uma conferência de três dias convocada pelo Dalai-lama para discutir o futuro da sua sucessão, na véspera do seu 90º aniversário.

Os participantes no encontro são lamas ou mestres espirituais, muitos deles reconhecidos como Rinpoches --- considerados reencarnações de sábios do passado --- e responsáveis pelas principais escolas e mosteiros tibetanos. Este grupo constitui o corpo espiritual encarregado de conduzir o processo de reconhecimento da nova reencarnação do Dalai-lama.

Segundo fonte próxima da organização, o atual Dalai-lama abordará com os lamas a questão da sua eventual sucessão como líder espiritual do povo tibetano.

A tradição budista tibetana sustenta que os mestres iluminados renascem para dar continuidade ao seu legado espiritual. O 14º Dalai-lama completa 90 anos no domingo, e espera-se que aproveite a ocasião para deixar pistas sobre o local onde poderá encontrar-se o seu sucessor ou sucessora, após a sua morte.

Pequim, que considera o Dalai-lama um separatista desde a sua fuga do Tibete em 1959, já afirmou que pretende controlar o processo de escolha do próximo líder espiritual tibetano. O Dalai-lama rejeitou essa possibilidade, declarando que a sua reencarnação ocorrerá fora da China, e apelou aos seus seguidores para ignorarem qualquer nome imposto pelo Governo chinês.

A cidade indiana de Dharamshala, onde o Dalai-lama reside desde o exílio, acolhe nos últimos dias os líderes das diversas escolas budistas para a conferência que antecede as celebrações do fim de semana.