O Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, esta quinta-feira, a condenação a 10 anos de prisão do antigo ministro Manuel Pinho, por ter sido corrompido pelo ex-banqueiro, punido com seis anos e três meses de cadeia. No acórdão, a que a SIC teve acesso, a Relação entende, porém, que Ricardo Salgado "não está no patamar de incapacidade" que alega.

“Não tendo prestado o Arguido [Ricardo Salgado] declarações, operou o silêncio. Tendo operado silêncio o Tribunal a quo na sede própria o referiu nos termos legalmente impostos, em que firmou que tal não lhe acarretava prejuízo nem benefício. Fê-lo à luz duma prova pericial da qual decorre que o Arguido estava apto a prestar declarações, pelo que se não as prestou tal resulta de ter optado/anuído/feito uso desse direito [ao silêncio], e não de qualquer circunstância em que comprovadamente estivesse eivado de opção livre e consciente”.

Mais, entende a Relação: “Ao contrário do que parece poder estar a ser entendido, o Arguido não é agora inimputável”, ainda que “seja certo que (…) padece hodiernamente de uma situação pessoal de doença mental, geradora da necessidade de cuidados a esse nível, igualmente temos como certo que o mesmo não está no patamar de incapacidade que alega.” Isso resulta "de forma clara da prova pericial junta aos autos", desta o acórdão a que a SIC teve acesso.

“O que nos leva diretamente à desnecessidade de extrair qualquer consequência jurídica em face de uma impossibilidade de compreensão do processo por parte do Arguido e de impossibilidade de se defender, por tal não se verificar. Consequentemente, temos para nós que nenhuma afronta ao princípio da dignidade humana, mormente na vertente da proibição de diferenciação, ocorreu”, conclui.

Ainda assim, e no que respeita ao cumprimento da pena da cadeia, a Relação admite que há outras soluções para o caso de Ricardo Salgado.

“Estar doente nos moldes em que o Arguido está, determinará, na normalidade da evolução do estadio da doença, uma tão gradativa quão excessiva dependência em relação a terceiros e representa um sofrimento específico. Esse quadro, de forma inumana, agrava-se em sede prisional, porquanto neste meio exige-se uma capacidade física e psíquica específica para o cumprimento de pena, (…). Nesse enquadramento, e correspondendo a uma tradição jurídica nacional de humanização do sancionamento criminal, que a legislação prevê várias soluções”.

Contactada pela SIC, a defesa do ex-banqueiro Ricardo Salgado diz que ainda vai analisar o acórdão, mas lembra, pela voz do advogado Francisco Proença de Carvalho, que “a doença do dr. Ricardo Salgado está totalmente comprovada por perícias independentes, encontrando-se no segundo estádio mais grave da doença e totalmente dependente de terceiros para quase tudo na sua vida diária, incluindo as necessidades mais básicas”.

Salienta também a defesa que o “próprio Ministério Público já requereu o estatuto de maior acompanhado”, pelo que “qualquer tentativa judicial de desvalorizar a doença ou assenta em ignorância ou em má-fé e, sem dúvida, atenta contra a dignidade humana do dr. Ricardo Salgado e de qualquer doente de Alzheimer”.

Lembra ainda a defesa do ex-banqueiro que “há mais de um ano, o próprio Supremo Tribunal de Justiça assinalou que a doença [de que padece Ricardo Salgado] devia ser relevada e considerada”.

O que está em causa?

Em causa no caso EDP, recorde-se, está o alegado recebimento pelo antigo ministro da Economia (2005-2009) de cerca de 4,9 milhões de euros, incluindo uma mensalidade de cerca de 15 mil euros enquanto integrou o Governo, para favorecer os interesses do Banco Espírito Santo (BES).

Manuel Pinho, de 70 anos, foi condenado por corrupção passiva, branqueamento de capitais e fraude fiscal, enquanto Ricardo Salgado, de 80 anos e diagnosticado com Alzheimer, foi condenado por corrupção ativa e branqueamento de capitais. Já Alexandra Pinho, de 64 anos e mulher do ex-ministro, foi condenada por branqueamento de capitais e fraude fiscal.

A condenação do Tribunal Central Criminal de Lisboa, confirmada esta sexta-feira "na íntegra", remonta a junho de 2024 e, a 25 de março de 2025, nas alegações finais do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, a defesa do ex-ministro tinha reiterado que este "é inocente do crime de corrupção".

Embora as decisões executivas sob suspeita neste processo não envolvam a EDP, o caso resultou da investigação às chamadas rendas excessivas da elétrica, cuja acusação foi deduzida em outubro de 2024 pelo Ministério Público, incluindo contra o ex-governante.

Manuel Pinho está em prisão domiciliária desde dezembro de 2021 e os restantes arguidos em liberdade.

Com LUSA