A dança das cadeiras pegou de estaca no início do ano. Pelo menos no futebol português.
O Sporting já era o categórico vencedor da Supertaça e, quando estava prestes a ser levado ao colo de um confortável 3-0, viu um transfigurado FC Porto ocupar-lhe o lugar.
O mesmo Sporting já era o anunciado vencedor do (bi)campeonato e, quando estava prestes a ser levado ao colo por uma série de triunfos com o selo Amorim, viu a concorrência ressuscitar durante a curta gerência de João Pereira.
O Benfica já era o anunciado vencedor da aposta feita por Rui Costa ao fazer regressar Bruno Lage e, quando estava prestes a ser levado ao colo pela magia de Di María, viu-se obrigado a descer à Terra por obra e graça de Rui Borges e Carlos Carvalhal.
O FC Porto pós-Aveiro já era o anunciado vencedor da aposta feita por André Villas-Boas ao promover o adjunto a treinador principal e, quando estava a ser levado ao colo pelos golos de Samu, viu a eliminação na Taça de Portugal colocar em risco a revolução de alto a baixo.
Um a um, os três grandes rodaram pelo exclusivo assento destinado aos que gravam o nome na história. Na dança das cadeiras, depois da ida de Ruben Amorim para o Manchester United, ninguém teve tempo para aquecer verdadeiramente o lugar e é quase certo que só em maio se conhecerá o grande triunfador de 2024-25.
Até lá, são incógnitas atrás de incógnitas, a começar pelo resultado do apetecível clássico que a SIC hoje transmite e que corresponde à primeira meia-final da Taça da Liga. Após dois confrontos na temporada que deixaram as contas empatadas entre estes gigantes, Sporting e FC Porto voltam a testar-se mutuamente, sendo que o desfecho também vai servir para indiciar quem merece mais a liderança da prova maior.
Claro que será apenas um indício e nunca se sabe até que ponto os ponteiros do Nacional vão desregular o favoritismo dos portistas no jogo que falta completar a partir das 17h00 ou… das 18h00 do próximo dia 15. Seja qual for a conclusão a extrair assim que estiver fechada a primeira metade do campeonato e seja qual for o nome do primeiro finalista da Taça da Liga, a verdade é o FC Porto parte à frente dos demais, na linha do que aconteceu em agosto.
Leiria vai glorificar no sábado o comercializado campeão de inverno e até pode dar-se o caso de o emblema da Invicta bisar nas conquistas da época. Depois de terem posto as mãos na Supertaça e sérios candidatos ao degrau mais alto do pódio da Liga Betclic, os azuis e brancos beneficiam de um conforto emocional que não acompanha os rivais diretos e que presta tributo à resiliência e à paciência demonstradas pelo presidente do clube.
QUEM GANHA NÃO É CARRO DEMAIS
Ao contrário de Rui Costa e de Frederico Varandas, que nos momentos de maior turbulência foram incapazes de resistir à pressão externa e avançaram para as chicotadas psicológicas, André Villas-Boas (AVB) aguentou o técnico e tem hoje uma margem de manobra que paga juros à sua coragem.
No fundo, AVB permitiu a Vítor Bruno continuar a andar depois de o carro ter sido abalroado ou vandalizado na bruma do Olival e o treinador retribuiu com vitórias que disfarçam a qualidade média do plantel.
Até nisso, as duas personalidades estão em perfeita sintonia. Nem o míster se atreve a pedir reforços caros neste mercado de janeiro e nem o presidente achará necessário hipotecar mais a saúde financeira da SAD face ao aproveitamento cabal do ouro da casa.
A maneira como o sucessor de Sérgio Conceição foi capaz de se aperfeiçoar na arte de reconversão e gestão de determinados elementos do balneário espelha um dos principais segredos da discreta reafirmação do FC Porto.
Após a transferência falhada para a Arábia Saudita, o inconsolável Galeno passou a ter espaço apenas como lateral-esquerdo e Otávio nunca ficou esquecido e voltou quando o técnico entendeu que tinha condições anímicas para retomar a parceria com Nehuén Pérez.
Isto no que respeita aos reajustes da defesa. No meio-campo, o capitão Alan Varela perdeu posição e estatuto e, a exemplo de Fábio Vieira, percebeu que o historial e as qualidades naturais não são suficientes para adormecer à sombra dos companheiros.
Por falar em qualidades naturais, a ascensão gradual de Rodrigo Mora corresponde a outra faceta do trabalho de ourives de Vítor Bruno. O principezinho do reino do dragão era, pelos treinadores de bancada, há muito um reivindicado titular mas só passou a tratar por tu os mais velhos quando quem manda percebeu que não iriam tremer-lhe as pernas na hora de ligar os circuitos do ataque.
Quase em paralelo com o lançamento de Mora às feras, o resgate de André Franco, Iván Jaime e do próprio Gonçalo Borges refletiu uma medida que fez o grupo sentir que todos contam… mesmo, chamem-se eles Vasco Sousa ou Danny Namaso.
Já Bruno Lage, não pode dizer o mesmo, apesar de ter adotado o lema em pleno relvado do Louis II e vitaminado pelo 3-2 festejado na casa do Mónaco. O “todos contam” na versão encarnada é só uma frase dos velhos manuais que não convence jogadores, não convence a crítica nem tão-pouco os adeptos do Benfica.
De António Silva a Schjelderup, passando por Prestianni e Rollheiser, sem esquecer suplentes de eleição como Beste, Barreiro ou Cabral, não faltam na Luz nomes que traduzem um desperdício de competências que contrasta com os Joões Simões e os Rodrigos Mora da concorrência direta.
Promover a rotatividade não é mexer na equipa à passagem dos 60 minutos. Enquanto não corrigir este equívoco, enquanto não fizer uma gestão sem estar preso ao passado, Lage acabará por estafar cada vez mais um onze que fisicamente tem exigido o impossível a Bah, Carreras, Aursnes e Akturkoglu, sem esquecer o incontornável Di María.
Neste aspeto, o sucessor de Roger Schmidt tem de aprender com Vítor Bruno. Ninguém é mais do que ninguém e partem todos em condições de igualdade.
É exatamente igual ao que acontece na dança das cadeiras, sendo que a de Bruno Lage já baloiça muito na véspera do segundo desafio consecutivo com o Sporting de Braga.