Se já olhou com atenção para o seu recibo de ordenado, provavelmente ficou chocado com o que viu. O equivalente a mais de um terço do que trabalha num ano vai direitinho para os cofres públicos, sem sequer passar pelo seu bolso, sem que lhe deem a opção de escolher se quer entregar essa gorda fatia de rendimentos ao Estado, em troca de serviços básicos, como a saúde ou a educação, ou se prefere reservar parte dela para gerir de acordo com as suas preferências — constituindo um bom seguro de saúde ou procurando respostas no ensino privado, por exemplo. E o seu empregador ainda tem de pagar mais uma "prestação" ao Estado.

Tomemos por exemplo um salário bruto mensal de 1.602 euros (o atual salário médio em Portugal): para lho pagar, a empresa gasta 1826 euros, mas quem faz o trabalho recebe apenas 1.438; ou seja, quase 400 euros vão direitinhos para o Fisco e a Segurança Social.

Os portugueses pagam demasiados impostos? Para o economista João Duque, a resposta vai além de um simples "sim". É que mais do que a carga fiscal que nos pesa cada vez mais — mais de 37% daquilo que recebemos, vai-se em impostos diretos e contribuições sociais — há que pesar o que recebemos em troca. "Os portugueses sentem que o serviço que têm não corresponde à expectativa que têm quando pagam os impostos", explica o também presidente do ISEG. Há áreas que tem de ser o Estado a garantir, e em que até o faz com grande qualidade, como é o caso do ensino superior público, mas noutras pode ganhar-se havendo alternativas.

Claro que o problema não está apenas nos rendimentos do trabalho, antes se alarga a todo o tipo de rendimentos. Há os rendimentos do trabalho, das empresas, os lucros, as rendas, mais-valias, etc., e todos pagam impostos para redistribuir a riqueza. "Seria muito interessante se pudéssemos ter parte do que são os nossos rendimentos ancorada no trabalho e outra em juros, lucros de ações, rendas, aplicações... Até porque essas aplicações, nomeadamente expressas em investimentos imobiliários, constitui poupança", lembra o economista.

"Em 2024 registou-se o recorde da percentagem do PIB a vir do rendimento do trabalho", nota João Duque, apontando que isso se deve ao aumento de pessoas a trabalhar. Problema: temos volume, mas não qualidade. Ou seja, há mais pessoas a trabalhar mas em empregos de pouco valor acrescentado, o que tem prendido o salário médio abaixo do que poderia estar. Como se progride?

Numa conversa de 15 minutos, em mais um episódio do podcast Acerto de Contas, do SAPO, o economista João Duque dá pistas e explica a economia por trás das promessas eleitorais. E no final aponta o "pecado capital" e a "subida aos céus" naquilo que são as políticas públicas desenhadas para uma solução.

Em seis episódios, o Acerto de Contas aborda seis temas-chave na campanha às Legislativas 2025 e que vão marcar a governação após as eleições de 18 de maio. Além da habitação, da saúde, da imigração, das contas certas e dos salários, olhamos caminhos para fazer crescer o país.

O último episódio do Acerto de Contas chega já amanhã, focado na receita para a riqueza. Afinal, como é que se pode aproveitar ao máximo o que aqui se faz? E como se assegura que o talento fica ou é atraído a Portugal? Veja tudo aqui no SAPO ou no Spotify.