Vem aí um novo governo. Mas continua a não haver mercado que desencadeie uma indústria, logo muito menos há tradição do que exige feroz competição: exportação. Mas há eleições.

E não fosse o que não temos, as eleições seriam, para nós, só a mais genuína e entusiástica expressão da Democracia. Mas sem mercado nem indústria, a criação e produção das Artes interrompe-se, ainda mais, quando o sopro da nossa vida nacional nos chama a dizer nas urnas o que ainda julgamos possível vir a ser concretizado.

Onde há mercado e indústria, desde a Polónia a Espanha, a expressão da opinião dos eleitores nas urnas é só aliciante. Aqui já não é bem assim, esvai-se o aliciante, porque aparentamos trabalhar para substituir a festa do direito pela obrigação, de votar. Mas lá estaremos, dia 18, absolutamente na convicção de que o que até aqui nos trouxe há-de acabar por inspirar o próximo Governo a fazer o óbvio: reconhecer a entropia, a injustificada distância a que estamos dos outros países, eleger as soluções num programa reformista e executar. Ou seja, para que aqui façamos acontecer o que noutros países se tem vindo a cumprir.

Nesses outros, foram os governos – ouvindo os profissionais - que não só perceberam o alcance da produção de conteúdos de marca autóctone como respeitaram o sector, e souberam agir provocando um mercado que desencadeou uma indústria e, de seguida e não menos importante, abrindo canais de relação com os potenciais compradores de conteúdos no mundo.

E, contribuindo, contrariamente ao que se pensa, para o sucesso hegemónico, da produção e distribuição de conteúdos nos e dos EUA não foi a indústria que tudo fez. Foram os governos que desde cedo decidiram ouvi-la e reagir, dando-lhe, mais do que suporte, meios legais e apoios financeiros para o seu crescimento objectivo, consolidação e projeção – o tal Governo de nós para nós. Mesmo com nuances políticas distintivas.

Em Portugal ainda não descobrimos as luzes, pese embora ocasionalmente perorarmos sobre o assunto, sumariamente, num convicto mas surdo desprezo pela revitalização e coesão social da acção das Artes e Cultura. Mesmo quanto a este meu protesto, que é o de muitos, se junta a evidência dos números, como nos demonstra o fundamentado Estudo do GEPAC – A Dimensão Económica do Sector da Cultura.

O comparativo com outros países na criação de riqueza gerada pelo sector da Cultura nas contas nacionais é, para nós, portugueses, no mínimo, exasperante: Espanha (2,8%), Finlândia (3%), República Checa (2,4%) e Polónia (3,2%). Nós ficamos nos 1,7%. O Estudo do Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais acrescenta: “(...) livros e publicações constituem o domínio cultural com maior peso nas Economias, seguido do Audiovisual e Multimédia. O Património, Arquivos e Bibliotecas e as Artes do Espetáculo constituem as menores fatias do setor cultural, para a maioria dos países”. E mais: “A cultura não é um setor menor ou de nicho das economias em estudo, equipara-se, em dimensão, à Agricultura, Indústria Alimentar ou Setor Automóvel”.

Esta realidade brutal não ocorre por incapacidade dos profissionais do sector em Portugal., como se tem vindo a provar. E, no entanto, desde a queda do Governo, novamente, ainda ninguém se lembrou de falar destas coisas da Cultura; do Património à criação e fruição, da progressão da matriz de hábitos e costumes na sociedade, da aquisição de conhecimento e competências - nadinha.

Posto isto e partindo do princípio de que, por vezes, muito ainda se renova no eterno curso do devir, votarei com esperança, porque, mais do que optimista, sou teimoso. Tal como não deixarei de insistir junto do novo Governo para que, num acto de realismo, nos ouça e aja.


Não precisamos de um remake, corre quase sempre mal. Precisamos antes do inesperado, muito esperado.