
Por coincidência ou talvez não, ficou ontem a saber-se que nenhum árbitro português vai estar no campeonato do Mundo de clubes, nem na qualidade de juiz de campo nem enquanto elemento integrante das equipas de videoarbitragem.
Menos de 24 horas depois de mais uma polémica no futebol nacional com origem no comunicado lançado pelo Benfica a propósito da atuação de António Nobre, a FIFA voltou a mostrar o cartão vermelho a Portugal, há bem pouco tempo expulso do Comité Executivo da UEFA na sequência da desavença entre Fernando Gomes e Pedro Proença.
Quando se pensava que as recentes eleições para a Federação Portuguesa de Futebol e para a Liga poderiam marcar uma nova era, o incurável provincianismo de alguns dirigentes arrasa a credibilidade e a imagem exterior de um País que insiste em trair-se a si próprio, diminuindo de tamanho todas as semanas.
A pequenez que assenta na vontade de ganhar sem olhar a meios continua a esmagar as melhores intenções de quem acredita que a centralização dos direitos desportivos e a chegada ao poder de jovens presidentes são bandeiras de uma revolução imparável.
De resto, bastaria olhar para a maneira como os quatro da frente se posicionaram na corrida para a liderança da Liga, com Sporting e Benfica do lado de Reinaldo Teixeira e FC Porto e Sporting de Braga a sustentarem o voto em José Gomes Mendes. Na hora H, os clubes de maior dimensão são incapazes de pensar o negócio para benefício de todos e só em situações de conveniência cirúrgica fingem parcerias que de natureza estratégica só têm a circunstância.
Se fosse real o desejo de fazer evoluir a modalidade de acordo com princípios de igualdade, tolerância e transparência, proporcionando dividendos equitativamente distribuídos, os dois concorrentes ao título não insistiriam em manobras de pressão que se destinam a assegurar o primeiro lugar a qualquer custo, pouco se importando com os danos causados junto de classes e de agentes desportivos.
A última entrevista dada por Frederico Varandas à Sporting TV e o referido comunicado do Benfica a propósito dos casos de arbitragem no Santa Clara-Sporting e na receção ao Arouca recuperam o pior que já se tinha visto quando os departamentos de comunicação dos três grandes (na altura, com o FC Porto envolvido como nunca) assumiam o protagonismo na selvática disputa mediática.
VERDADE E COINCIDÊNCIA
Para cúmulo, as principais vítimas estão dentro de casa e sofrem na pele o condicionamento que resulta de um discurso que não lhes passou pelas mãos nem nunca ninguém lhes disse para autorizar. Chega a ser confrangedor ver como Rui Borges e Bruno Lage fazem exercícios de puro contorcionismo para deixar no banco de suplentes as suas ideias e os seus princípios de maneira a corresponder às diretrizes de quem está acima e mete todas as fichas na máquina de intoxicar.
Os dois treinadores de certeza que não combinaram, mas ambos se refugiam no apelo a “um único critério” por parte dos árbitros para acompanhar a propaganda oficial e varrer para debaixo do tapete as insuficiências reveladas dentro de campo. Quando um só jogador do ataque do Sporting ou do Benfica custa tanto como o plantel do Santa Clara ou do Arouca (exemplificando apenas com os adversários deste último fim de semana), percebe-se melhor as dificuldades de Borges e Lage para olharem de frente e usarem os árbitros como escudo contra as críticas que nascem em função de resultados inesperados e desrespeitadores da lógica do favoritismo.
Como é evidente, no final da temporada, só haverá lugar para um único vencedor, mesmo que o campeão da Liga não festeje a dobradinha na Taça de Portugal. Os dois rivais da capital podem encontrar-se no Jamor e seja qual for o capitão a levantar o troféu, esse privilégio, no máximo, pode corresponder à imagem da cereja em cima do bolo, mas nunca representará uma medalha de consolação face a um segundo lugar na Liga.
Aliás, uma vez que a final da Taça fecha oficialmente a época, não será de descartar que esse jogo corresponda ao último de Rui Borges ao serviço do Sporting na eventualidade de os leões falharem o bicampeonato. Pode passar pela cabeça de Frederico Varandas entregar a do técnico para manter na sombra pesadas responsabilidades na substituição de Ruben Amorim.
No caso de Rui Costa, com eleições à porta, o cenário, perante festa verde e branca finda a 34.ª jornada, só não será inteiramente semelhante porque Bruno Lage terá pelo menos salvaguardada a orientação das águias no Mundial de clubes que arranca a 14 de junho. Se em cima do vermelho da FIFA à arbitragem o único treinador português representante do campeonato nacional ficasse em terra, a grande verdade é que estaríamos perante outra coincidência pouco ou nada... nobre.