A arbitragem portuguesa requer quadros específicos nos relvados e no sistema de videoárbitro (VAR) para tornar mais eficiente a sua intervenção perante essa divisão de funções na primeira Liga de futebol, apela o antigo árbitro Marco Ferreira.

"Passadas estas épocas todas, já devia existir um quadro específico de especialistas de VAR para que as funções fossem totalmente diferentes e cada um fizesse o seu trabalho. Muitos árbitros de VAR estão a competir para a mesma tabela que os de campo. Até que ponto isto não pode ter influência, não digo de forma deliberada, mas inconscientemente, em situações de dúvida? Um VAR não intervirá numa decisão de interpretação do árbitro em campo e muitas vezes surgem erros graves devido a essa situação", declarou o ex-árbitro madeirense, pertencente à primeira categoria nacional de 2007 a 2015.

Esta época, o Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) reuniu 16 especialistas de VAR, mas esse papel também foi desempenhado no escalão principal por 20 dos 24 'juízes' de campo da categoria C1 anunciados em julho de 2024.

"Ao longo destas últimas temporadas, houve situações em que o VAR não foi eficaz nem teve a intervenção que deveria ter tido, mas isto também tem muito a ver com a falta de organização do CA anterior. Espero que o novo CA resolva isso, apesar de os sinais não serem muito positivos nesse aspeto", reconheceu, aludindo à transição de poder de José Fontelas Gomes para Luciano Gonçalves em fevereiro, por ocasião das eleições da FPF.

Desde então, Marco Ferreira, de 48 anos, viu "nomeações mais diversificadas para jogos dos candidatos ao título", mas isso não impediu João Pinheiro, promovido à categoria de elite da UEFA este ano, de dirigir a receção do Benfica ao agora bicampeão Sporting, no dérbi lisboeta da 33.ª e penúltima ronda, que podia ter concedido o título a qualquer rival.

"No jogo mais importante da época, o conselho de arbitragem foi pelo caminho mais fácil e nomeou o primeiro classificado [de 2023/24] e o mais categorizado. Isso dá conforto ao Conselho de Arbitragem e ninguém pode apontar o dedo, pois, independentemente do que se pudesse passar no relvado, levou o melhor árbitro para o melhor jogo. Espero que 2025/26 comece já com mudanças: que o quadro de VAR passe a ter só especialistas, que as equipas sejam o mais fixas possíveis e que a nota atribuída pelo observador seja única para árbitro, assistentes e VAR", disse.

Além da Supertaça, vencida pelo FC Porto frente ao Sporting, e da final da Taça da Liga, com triunfo do Benfica sobre os 'leões' nas grandes penalidades, João Pinheiro dirigiu quatro dos seis jogos 'grandes' na I Liga , enquanto que Luís Godinho e Fábio Veríssimo estiveram nas outras partidas mas mediáticas.

"Estamos a sofrer com as decisões erradas de CA passados, que se desfocaram do que era mais importante: tentar desenvolver a arbitragem portuguesa e colocar árbitros com capacidade e condições para evoluírem internacionalmente e atingirem a elite da UEFA. Olhamos para o restante quadro e não vemos mais nenhum árbitro que seja unânime e tenha condições para fazer estes grandes jogos. Depois, isto torna-se uma bola de neve, porque o João Pinheiro, sendo nomeado para os jogos mais importantes, é avaliado de maneira diferente e tem um fator de classificação superior ao de outras partidas", expôs.

Marco Ferreira louva os "sinais muito positivos" recebidos pelo setor com as designações recentes do barcelense João Pinheiro para arbitrar uma meia-final da Liga Conferência e ser quarto árbitro no duelo decisivo da Liga dos Campeões masculina, entre Paris Saint-Germain e Inter Milão, em Munique, onde Bruno Jesus surgirá como assistente reserva.

Na final da 'Champions' feminina, que ocorrerá entre FC Barcelona e Arsenal no Estádio José Alvalade, em Lisboa, Tiago Martins será VAR, tal como em 2021/22, tendo surgido também nessa função na Finalíssima e na Supertaça Europeia de 2022 , bem como nas decisões da Liga Conferência de 2022/23 e 2023/24 e do Campeonato da Europa de sub-21 de 2023.

"Penso que este CA, com pessoas experientes na matéria, vai encontrar alguma solução, mas levará algum tempo. Os árbitros até poderão ser bons, mas, não tendo experiência, acabam por ficar muito marcados pelos erros cometidos ao longo do percurso e, quando chegarem àquele nível, já têm um registo negativo muito pesado na opinião pública, que influenciará sempre: um pequeno erro vai ser sempre valorizado como um grande erro e esse é o maior problema", alertou Marco Ferreira, vendo o setor "a fazer o seu caminho" quanto à atração de mulheres, após Catarina Campos, especialista de VAR nas provas profissionais masculinas, ter sido elevada a primeira 'juíza' principal na I Liga em março.