Joker, Arthur Fleck. Homem-Aranha, Peter Parker. Viúva Negra, Natasha Romanoff. Batman, Bruce Wayne. Homem de Ferro, Tony Stark. Hulk, Bruce Banner. Feiticeira Escarlate, Wanda Maximoff. Capitão América, Steve Rogers.

Também Álvaro Carreras flui entre duas versões de si mesmo. Ou, por outras palavras, para melhor compreensão dos seres vivos que não vivem em livros de desenhos animados, o espanhol é como aquele amigo que muda de personalidade mediante a presença ou não da namorada. Portanto, taticamente, quando Jan-Niklas Beste não está no onze, Carreras é uma coisa bastante diferente daquela que é quando coexiste com o alemão dentro do campo.

O lateral do elástico a desviar os longos cabelos teve, na primeira parte, contra o Farense, o papel de andar a vaguear pelo corredor esquerdo, com Kerem Aktürkoğlu infiltrado nas profundezas interiores do bloco defensivo dos algarvios. Com concordância de Bruno Lage, Carreras aboliu a autocensura e expressou-se um pouco por toda a banda, recusando, inicialmente, o papel de terceiro construtor que tem quando Beste também está em campo. Na segunda parte, transfigurar-se-ia, passando de um bom para um ótimo nível.

Foi no limbo de Álvaro Carreras, entre ir e ficar, que o resultado do jogo (1-2) da décima jornada se começou a construir. Porém, primeiro o Farense mandou abaixo o propósito do Benfica fazer uma exibição limpa para, só depois, os encarnados edificarem a vitória que os mantém a oito pontos (com menos um jogo) do líder Sporting.

Ricardo Velho foi até quase à linha do meio-campo para bater um livre. O avanço do guarda-redes do Farense denotava o quão a equipa de Tozé Marreco queria espremer a ocasião de subir linhas. Não é que os leões do sul não estivessem a ser audazes. Sobretudo através de Paulo Victor, o Farense procurou saídas associativas em zonas recuadas. Ainda assim, não foi fácil que o 5x4x1 (5x2x2x1 na segunda parte) passasse a um 3x4x3 em fase ofensiva.

Desse livre, despejado por Velho na frente, o Farense ganhou uma sucessão de segundas bolas que avivaram a chama do ataque. Carreras e Aktürkoğlu não se entenderam na cobertura do espaço em que Pastor apareceu a guiar um cruzamento para o ponta de lança espanhol, Darío Poveda, estreante a marcar esta época.

LUIS BRANCA

Era legítimo que se questionasse a composição do centro da defesa do Benfica, zona onde a finalização surgiu. António Silva tinha saído do jogo contra o Santa Clara, para a Taça da Liga, mais saciado face às sucessivas ausências do onze inicial. Porém, não serviu o duelo com os açorianos para mais do que um curto matar de saudades. No Algarve, os zeladores do eixo voltaram a ser Tomás Araújo e Otamendi.

O protagonismo, agora positivo, voltou a ser chamado ao corredor esquerdo do Benfica. De dentro para fora, Aktürkoğlu soltou em Carreras que, a voar nas asas da referida liberdade, empatou. A partir daí, o domínio acentuou-se muito graças à entrada de Jan-Niklas Beste. O alemão intimidou as subidas de Carreras, que passou a retrair-se mais em troca da estabilidade da equipa, o que é uma virtude e não um defeito.

LUIS FORRA

Cláudio Falcão e Ângelo Neto, os dois médios do Farense, entupiram bem o corredor central. Florentino e Orkun Kökçü entraram assim em queda na bolsa de influência. No entanto, o Benfica viveu bem com a ideia de exteriorizar o jogo e até variou mais as regiões que frequentou ofensivamente. Di María passou a destacar-se e a servir a esfera de ação de Pavlidis. Na segunda grande ocasião que teve, o grego completou a reviravolta.

De modo a receber mais adeptos do adversário, o Farense preferiu defrontar o Benfica no Estádio Algarve. A equipa que está em último lugar da Primeira Liga (e por lá vai continuar) avistou um oásis nos últimos dez minutos. Os encarnados deixaram-se iludir pela mentirosa sensação de que a vantagem era maior do que realmente acontecia. Desta vez, os jogadores de Bruno Lage não cederam, mas estivesse o Farense a jogar no bem mais acolhedor Estádio de São Luís e o caldeirão podia-se ter entornado.