![Veredito no caso Gisèle Pelicot](https://homepagept.web.sapo.io/assets/img/blank.png)
Dominique Pelicot, pai de Caroline e, agora, ex-marido de Gisèle, foi condenado, em 2024, a 20 anos de prisão, com uma pena de segurança de dois terços, por drogar e violar a ex-mulher, sujeitando-a também a ser violada enquanto estava inconsciente por dezenas de homens desconhecidos que recrutava na internet. Dominique está preso desde 2020 e há ainda outros 50 co-acusados.
"Este veredito não esteve à altura dos atos bárbaros que a minha mãe sofreu e este era suposto ser o julgamento histórico da submissão química , mas não senti que tivéssemos recebido sentenças históricas", disse Caroline Darian, 46 anos
Caroline questiona-se se o pai cumprirá a totalidade da pena de 13 anos que lhe resta, tendo em conta a sua idade, e diz-se surpreendida com as penas dos outros 50 co-acusados, homens entre os 27 e os 74 anos, que tiveram penas inferiores ao que a Procuradoria tinha pedido.
" (Fiquei) bastante surpreendida ao ver que a maioria tinha sido condenada a penas entre três e dez anos, quando, em França, a pena para a violação é de 11 anos... Penso que a vergonha ainda não mudou de lado, a prova está no facto de que, dos 51, incluindo Dominique, hoje há 14 a cumprir pena, não é um número insignificante", defendeu.
Durante o julgamento, Caroline diz ainda que não viu remorsos na maioria dos co-acusados, que continuam a pensar que "não foi grave", mas sente que este "é um primeiro passo para mudar as mentalidades" e é preciso que "outras vítimas mostrem o que é realmente ser sujeito a estas cenas teatrais num tribunal penal", uma "humilhação adicional" nos casos em que agressores destroem as vítimas e, também, as suas famílias.
Pessoalmente, Caroline Darian diz já não sentir qualquer ligação ao pai e também se considera uma vítima de Dominique, embora sem provas, após ter visto fotografias suas inconsciente numa cama em roupa interior, que terão sido tiradas pelo pai.
"É difícil para um filho pensar que ainda tem o ADN de um predador sexual em série, de um violador em série, e de uma vítima que hoje é considerada um ícone em todo o mundo, por ter aberto as portas a este julgamento... Nunca mais vamos ser a família que éramos, isso é certo. Já não tenho pai, considero-o como se tivesse morrido, porque não conheço esse indivíduo", afirmou.
Caroline destaca-se como um ícone na luta feminista em França e o seu novo livro "E Deixei de Te Chamar Papá" chega a Portugal, no dia 11 de fevereiro, pela editora Guerra e Paz
Este é o "primeiro testemunho literário" sobre o caso Pelicot, e para a autora é uma "honra poder publicar em vários países do mundo". O objetivo é consciencializar sobre a questão da submissão química.
"Assim que o livro foi publicado, recebi muitos testemunhos e disse a mim mesma que tinha verdadeiramente de ajudar, de continuar o combate para contar a verdade e dar voz às vítimas que ainda hoje são invisíveis em França... A submissão química, na maioria dos casos, ocorre na esfera privada, em casa, muitas vezes com vítimas que conhecem os seus agressores, que são do seu círculo próximo, pode ser um familiar próximo, um familiar distante, um tio, pode ser um colega de trabalho, um amigo de confiança", alertou.
A filha de Gisèle e Dominique Pelicot tem ainda uma associação, #Mendorspas (Não Adormeça, em português), criada há cerca de dois anos, com o mesmo objetivo de dar voz às vítimas e alertar para os perigos do uso de drogas ou substâncias psico-ativas para cometer agressão sexual. Através de grandes campanhas de sensibilização e com ajuda governamental, através da deputada Sandrine Josso (do partido presidencial e também a madrinha da associação), apesar da instabilidade política em França, esperam apresentar um relatório ao gabinete do primeiro-ministro no final de março ou início de abril.
"Espero que a cobertura mediática sirva também para encorajar as vítimas que sofreram mais ou menos a mesma coisa a divulgarem o seu próprio caso, não quero que se fique pelo julgamento de Gisèle e de Dominique... Gostaria de dizer às vítimas de hoje e de amanhã que devem investigar as suas dúvidas e não deixar essa sombra aos potenciais agressores", disse
Recentemente, Dominique foi interrogado em Paris por um alegado envolvimento num homicídio de uma jovem em 1999, numa violação em 1991 e numa agressão sexual em 2004. A filha acredita que com Dominique Pelicot tudo é possível.
"Estou à procura da verdade mesmo depois do julgamento, tenho a convicção que nos últimos quatro anos, se tivesse acontecido durante dez anos na nossa casa, não teria começado em 2011"