A Defesa Nacional é por excelência uma das áreas de soberania mais importantes para qualquer estado democrático e, por norma, é uma pasta de extrema exigência no que à conduta dos titulares da pasta diz respeito. Exige, ainda mais que as demais, uma postura e um sentido de Estado que congregue vontades e crie estabilidade política para a concretização de medidas estruturais que dignifiquem as Forças Armadas e a imagem do país no exterior.
Com esta consciência, e com total seriedade perante a matéria, não custa admitir que, com o maior superavit da democracia portuguesa, com as políticas adotadas na área da Defesa nos últimos anos, nomeadamente a criação de quadros permanentes no Exército e na Força Aérea, conseguidos pelo governo liderado pelo Partido Socialista (PS), com os aumentos fechados com as Forças de Segurança pelo atual Governo da AD, não restava outra decisão ao Ministro da Defesa que não fosse aumentar os salários e suplementos das Forças Armadas Portuguesas.
Quando rebentou uma guerra na Europa que aumentou os desafios de equipamento e produção de meios militares; quando a plataforma continental portuguesa foi alargada; quando o número de efetivos reduz drasticamente (sobretudo entre 2011 e 2015, de forma deliberada, consciente e assumida no Programa Defesa 2020); quando se torna difícil travar as saídas de civis e militares para o privado; não havia outra saída ao titular da pasta da Defesa.
O clima de paz e estabilidade em que Portugal tem vivido promove, de forma direta e indireta, a procura de investimento em políticas progressistas de evolução social e coloca o foco do investimento no aumento das condições de vida das pessoas, na competitividade económica e no combate a desigualdades. Ao longo de anos, isto tornou-se claro até pelo peso do investimento nos orçamentos da Defesa Nacional dentro dos Orçamentos de Estado do país.
Esta consciência, em conjunto com a necessidade de gerir os parcos recursos do país, levou inclusive à necessidade de criação de leis próprias que matizem uma visão de investimentos de médio e longo prazo na Defesa, tendo sido criadas nomeadamente as Leis de Programação Militar e a Lei de Infraestruturas Militares.
Perante este cenário, percebemos que a missão de um Ministro da Defesa se torna cada vez mais difícil e exigente, até ao nível do peso político que tem dentro do próprio governo. Mas também no que à sua conduta pessoal diz respeito. É neste cenário que chegamos à discussão do Orçamento de Estado da Defesa na Assembleia da República.
De forma clara, o Ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo, com a herança que recebeu pode tomar um conjunto de decisões importantes para as Forças Armadas com as quais concordo (e que aliás exigi em julho na Comissão de Defesa Nacional). Mas não revela duas características essenciais para a detenção da pasta: postura de Estado e agora, no Parlamento, mostrou não ter sentido de Estado!
Em sete meses, percebemos pelas várias polémicas desnecessárias em que esteve envolvido que não tem postura de Estado: percebemos isso quando, logo no início do mandato, falou da colocação de delinquentes nas Forças Armadas como “exercício académico” (sic); quando fala de Olivença de forma ligeira, e com o Regimento de Cavalaria nº 3 atrás de si, vindo depois fazer pior, dizendo que o fez na qualidade de líder do CDS e não enquanto Ministro; quando não foi capaz de defender os militares destratados pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros no Aeroporto de Trânsito nº1, em Figo Maduro (apenas dizendo “não tenho nada a declarar”).
Ora, falhou clamorosamente em três matérias que mostram, ou não, ter-se sentido de Estado: o cuidado com a comunicação, que deve ser contida e assertiva; o não uso dos militares para efeitos partidários; e a defesa da honra das Forças Armadas!
E agora, na passada quarta-feira, 13 de novembro, o Ministro mostrou a todo o país que também não tem postura de Estado. Num debate aceso sobre o Orçamento de Estado de 2025 para a área da Defesa Nacional, perante as Comissões de Orçamento e Finanças e a Comissão de Defesa Nacional, Nuno Melo deixou-se embrenhar no debate político partidário e foi fácil perceber que não tínhamos na Assembleia da República o Ministro da Defesa, mas sim, e apenas, o líder do CDS-PP.
Percebemo-lo quando de forma gratuita disse que “o valor reportado pelo PS à NATO não é verdadeiro”. Anunciou com isto um “buraco” (sic) de 300 milhões de euros que, segundo o próprio, consubstancia uma “mentira” (sic) à NATO. Mas a verdade não é esta.
Em primeiro lugar, importa destacar que o PS não comunica com a NATO. Quem o faz é o Estado Português, representante dos portugueses e, o Estado Português não mente à NATO.
Ora, de acordo com o que apurámos, a verdade é que o Governo Português não comunica sequer percentagens, mas sim os valores absolutos previstos com a Defesa Nacional – onde entram as verbas diretas de cada um dos ramos das Forças Armadas; da parte militarizada da GNR; da Caixa Geral de Aposentações; e até do Ministério dos Negócios Estrangeiros – que a própria NATO usa para, com o valor previsto pela OCDE para o PIB, definir a percentagem em causa.
Por outro lado, com a revisão do PIB do nosso país em alta – a previsão inicial para 2023 de um crescimento do PIB de 0,9%, passou, no início de 2024, para 1,2%, representando uma revisão em alta - é natural que todas as percentagens relativas ao PIB baixem, ou seja, num ano em que o PIB cresce acima do previsto, as percentagens dos valores executados em cada área reduzem diretamente o seu peso percentual no PIB.
Não percebendo a qual dos cenários se referia o Ministro, continuamos a aguardar o envio dos números anunciados pelo Ministro, na sessão, e imediatamente solicitados, para podermos perceber do que estamos a falar ao certo.
Ao ceder ao calor do debate, Nuno Melo não hesitou em colocar em causa a imagem externa do país, mostrando uma falta de postura de Estado inimaginável, não protegendo a imagem externa do Estado Português. Isto era o que se esperaria de um titular de uma pasta de soberania.
Aproveito este artigo de opinião para deixar um repto ao Ministro da Defesa Nacional (que descobri recentemente ser leitor dos meus artigos de opinião):
Senhor Ministro, o PS está disponível para voltar a criar um clima de diálogo permanente e construtivo sobre os grandes objetivos para a Defesa Nacional. Mas para isso há uma condição fundamental: que acabe com o clima de guerrilha que criou e adote uma postura de Estado, com sentido de Estado.