Tenho o hábito de rever filmes que vi há muitos anos. Quase sempre, verifico que o meu olhar de hoje, com mais experiência em cima, já não é exatamente o mesmo.

Num destes dias chuvosos de inverno, assisti novamente ao “Pay It Forward”, um filme que se baseia num romance com o mesmo nome e lançado para o cinema no longínquo ano 2000. A história retrata um movimento iniciado por um aluno de 11 anos (interpretado por Haley Joel Osment) numa disciplina de estudos sociais como resposta a um desafio lançado à turma pelo seu professor (interpretado por Kevin Spacey), que consistia em pensar numa ideia para mudar o mundo e pô-la consequentemente em prática.

A ideia do movimento pensado por este aluno consistia em ajudar três pessoas que, em vez de retribuírem o favor ao autor da ação que as beneficiava, teriam de fazer o mesmo e ajudar outras três pessoas (e assim consecutivamente), gerando favores em cadeia e uma corrente de boas ações.

Ao longo dos anos, tenho tido a sorte de ajudar na criação de comunidades. Uma delas foi a da Casa do Impacto, o hub de empreendedorismo social da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, no âmbito do qual são apoiados centenas de projetos de impacto, que pretendem contribuir para a resolução de problemas sociais ou ambientais. Na minha opinião, os que impreterivelmente têm tido mais sucesso são os que se baseiam na comunidade. Poderia dar inúmeros exemplos, mas refiro apenas alguns, como o 55 +, Go Parity, Transformers, Academia de Código, entre outros.

No início do ano, saiu um excelente artigo de Derek Thompson na revista “The Atlantic”. Em “The Anti-Social Century”, escreve sobre como os norte-americanos estão a passar cada vez mais tempo sozinhos e explora as consequências brutais da tendência nos comportamentos sociais, na política e até na relação com a realidade. O jornalista estabelece a possibilidade de a solidão ser o mais importante facto social do século XXI.

Em sentido semelhante, Mark J. Dunkelman, autor e investigador da Universidade de Brown, defende que a tecnologia fortaleceu tanto as nossas ligações mais próximas como as mais distantes (nomeadamente família e amigos); e distanciou-nos, por outro lado, de pessoas como os nossos vizinhos que vivem nas proximidades, não fazendo parte da nossa intimidade – mas da nossa comunidade. Para Dunkelman, «a comunidade é a base fundamental da coesão social. As famílias ensinam-nos amor e as tribos, lealdade. A comunidade ensina-nos tolerância. A comunidade é a maior arena para praticar empatia e compromisso».

É por isso urgente construir comunidades, redes, conexões e espaços que promovam acordos e desacordos construtivos e criem interdependência. São as comunidades que nos tornam mais resilientes e fortes económica e socialmente. Até em termos de longevidade, está comprovado que a esperança média de vida é superior onde se partilha um maior sentido de comunidade (veja-se o documentário “Blue Zones”, da Netflix). Numa altura em que se fala tanto sobre inovação, vale a pena reforçar que a mesma surge com mais intensidade em espaços abertos e colaborativos. Já sabemos que problemas complexos exigem inteligência coletiva.

É neste contexto que me encontro a co-construir uma nova comunidade, desta vez focada em investidores sociais, a Rede Capital Social. Trata-se de uma nova organização que pretende unir todos os stakeholders que queiram contribuir para a resolução de problemas sociais através da filantropia. Contribuir para a construção destes espaços colaborativos e comunitários tem sido um dos desafios com que mais tenho aprendido e simultaneamente que maior impacto tem tido na construção da minha própria identidade e na forma como interajo com o mundo.


Em 2025, vejo-o de maneira diferente, mas não deixei de acreditar na comunidade e no poder do «pay it forward».