O diagnóstico precoce é a chave para o tratamento do cancro e, quando existe rastreio, é importante que a população adira.
No caso particular do cancro da mama, a idade para a realização de rastreio baixou, recentemente, para os 45 anos. “As recomendações que tivemos até agora (rastreio para mulheres entre os 50 e os 70 anos) resultaram de estudos feitos nos anos setenta e oitenta, alguns até anteriores”, lembra José Luís Passos Coelho, presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia. Nesse sentido, é preciso olhar para a realidade e contexto atuais, concordam os peritos, considerando este alargamento do rastreio a pessoas mais jovens um passo acertado.
No caso das mulheres jovens, por exemplo, os cancros podem ser mais agressivos, tendo em conta que não raras vezes as causas para o seu aparecimento não são apenas hormonais, como acontece com grande parte das mulheres na altura, por exemplo, da menopausa.
3,5%
é o aumento de casos de cancro de mama em mulheres mais jovens.
“Há um aumento, a nível internacional, de novos casos de cancro da mama em mulheres mais jovens. Em Portugal, o número de novos casos de cancro da mama entre os 40 e os 50 anos é de mil, para um total de 7 mil por ano, logo, é um número que não é desprezável”, considera José Luís Passos Coelho, presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia
Aumento de casos preocupa especialistas, prevenção é urgente
Não é apenas o cancro da mama que tem sofrido um aumento de incidência, o número de casos associados a quase todas as neoplasias malignas têm vindo a crescer. “Todas as estimativas para os próximos anos para o cancro são ainda mais alarmantes, portanto não é estranho que cada vez mais a carga de doença associada ao cancro seja maior e, aquilo que sabemos, é que vai ser em idades cada vez mais precoces”, afirma Sónia Dias, diretora da Escola Nacional de Saúde Pública.
Tudo isto tem a ver com os grandes determinantes das doenças oncológicas e que passam por aquilo a que vulgarmente se chama de estilos de vida, o consumo de tabaco, de álcool, a dieta, a falta de atividade física ou até os níveis de obesidade. “Há um conjunto de determinantes que têm uma carga muito maior em idades mais precoces” do aquelas que existiam antes. “Há um acumular de vulnerabilidades que levam a que - muitas das vezes - este tipo de doença apareça cada vez mais cedo”, conclui a especialista.
Dado este aumento, estará o nosso sistema de saúde preparado para dar resposta a esta realidade? Para José Luís Passos Coelho, além dos sistemas de saúde estarem sobrecarregados, a longevidade também aumentou, e o aparecimento de cancro acaba por ser um dos preços a pagar para vivermos mais. Não obstante, mesmo com as dificuldades que advêm deste contexto, o especialista põe também a tónica nos bons resultados que o país consegue obter, em termos internacionais, relativamente à sobrevivência associada a cada cancro.
Segundo Eva Falcão, a existência de lista de esperas é “algo normal” porque, para a própria, “significa que estamos abertos e que recebemos pessoas”. A presidente do IPO recorda que Portugal não é um caso isolado no que toca às listas de espera, sendo uma realidade comum aos países que têm serviços públicos de saúde “onde há sempre uma porta aberta”.
O que é importante, para a especialista, é “gerir as listas de espera para cumprir com os tempos clinicamente aceitáveis”. No caso particular do IPO, que recebe cerca de 11 mil novos utentes por ano, 60% aparecem por contacto feito pela sua própria iniciativa e 40% via consulta prévia feita fora do IPO, como, por exemplo, em centros de saúde.
Impacto da hereditariedade no aparecimento do cancro
Cerca de 10% dos casos de cancro são de origem hereditária. Avaliar os genes permite não só prevenir o aparecimento de alguns cancros, como também pode permitir adaptar os tratamentos já depois do seu aparecimento. Ideia corroborada por José Luís Passos Coelho quando diz que a genética tem aplicação no aspeto preventivo, através do conhecimento que se tem da história familiar, mas também no aspeto terapêutico, sendo possível utilizar métodos terapêuticos específicos para os genes que podem estar no aparecimento dos tumores, em vez de tratar apenas o tumor em si.
Em Portugal, os testes genéticos são feitos sempre que é identificado um possível risco familiar. “É importante utilizar todas as ferramentas ao nosso alcance para atingir melhores resultados em saúde”, afirma Sónia Dias, acrescentado que apostar em todas as formas de prevenção também é garantir a sustentabilidade - inclusive a financeira - do sistema de saúde.
O IPO de Lisboa olha para esta questão com compromisso, tendo sido a primeira instituição a instaurar a consulta de risco familiar, sobretudo para patologias como o cancro do ovário, o cancro da próstata, o cancro da mama, entre outros. “Montámos a consulta e alimentamo-la o mais possível” - sendo que os recursos são sempre escassos - e como, neste caso, são utentes e não doentes, aqui o tempo de espera “é mais elevado”. Os resultados dos testes acabam por “alimentar a investigação clínica, que poderá fazer a diferença num conjunto de pessoas”, conclui.