Numa curta nota, o gabinete do primeiro-ministro Luís Montenegro informa que aceitou “o pedido de demissão" do secretário de Estado Hernâni Dias.
O pedido, lê-se na nota, foi “hoje [terça-feira] apresentado pelo secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Dr. Hernâni Dias” a quem Luís Montenegro “expressa reconhecimento pelo empenho na concretização do Programa do Governo em áreas de particular importância, e sublinha o desprendimento subjacente à decisão pessoal tomada”.
Quanto ao substituto, o primeiro-ministro promete que “oportunamente” será conhecido.
Hernâni Dias sai para "proteger" o Governo
Na carta de demissão do secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, a que a Lusa teve acesso, Hernâni Dias anunciou ainda que suspenderá o mandato como deputado para ser ouvido no parlamento.
"Estou de consciência absolutamente tranquila. Gostaria de reiterar que a minha demissão nada tem a ver com o receio de esclarecer as questões que têm sido veiculadas pela comunicação social. Bem pelo contrário, renovo a minha vontade e plena disponibilidade para prestar todos os esclarecimentos às autoridades competentes", refere.
O governante demissionário acrescenta que vai suspender o mandato de deputado para ser ouvido no Parlamento, aguardando a aprovação da sua audição já pedida por vários partidos, para "esclarecimento cabal de todos os assuntos, o mais rápido possível, e encerrar a desinformação que tem sido difundida".
Hernâni Dias disse estar a ser confrontado com "uma vaga de notícias que contêm falsidades, deturpações e insinuações injustificadas".
"E apesar de se referirem a situações totalmente desligadas das funções que desempenho, entendo que é minha obrigação proteger a estabilidade do Governo e, em especial, a posição do senhor primeiro-ministro", justifica.
O antigo autarca considera ainda que "na vida política há que ter a hombridade de assumir" decisões, dizendo que a sua "é pautada pelo entendimento de que, neste momento, a continuidade como secretário de Estado poderia ser vista como um fator negativo, logo prejudicial ao trabalho do Governo".
"Na oposição é fácil falar dos casos e casinhos"
"Era inevitável", considera Bernardo Ferrão. "A questão da Lei dos Solos vai ao Parlamento e essa situação estava a tornar-se muito complicada por causa do tal conflito de interesses".
Somado ao caso da demissão de Gandra d'Almeida, que, apesar de não ser membro do Governo, liderava a direção executiva do SNS, "já são duas polémicas na governação de Luís Montenegro", diz o diretor de informação da SIC.
"Isto mostra aos políticos que quando estão na oposição é fácil dizer que os outros é que têm casos e casinhos. Depois, quando chegam ao poder também têm casos e casinhos. Montenegro tem aqui o seu primeiro caso e não é simpático, que tira algum valor político a lei dos solos", afirma Bernardo Ferrão.
No mesmo painel de opinião, José Gomes Ferreira considerou que Hernâni Dias demorou "um tempo político demasiado excessivo" a sair.
Até porque "se este não fosse entendido como um caso grave", o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, "tinha uma maneira de amenizar a situação e dizer qualquer coisa como 'deixem as investigações ter o seu tempo'", o que não fez.
"Quando ele [Marcelo] diz que é um assunto que o primeiro-ministro tem de resolver, ou o próprio a tirar ilações, acabou por ditar a gravidade do assunto".
Num cenário em que esta decisão não tivesse acontecido, José Gomes Ferreira diz que na discussão, na especialidade, a lei dos Solos estaria "contaminada" por este caso: "Poderá ficar relativamente esvaziado, mas aparecerá sempre na discussão".
O caso que levou à demissão
Na sexta-feira, a RTP noticiou que Hernâni Dias criou duas empresas que podem vir a beneficiar com a nova lei dos solos, sendo que é secretário de Estado do ministério que tutela essas alterações.
Uma semana antes, o mesmo canal de televisão avançou que Hernâni Dias estava a ser investigado pela Procuradoria Europeia e era suspeito de ter recebido contrapartidas quando foi autarca de Bragança.
Na terça-feira da semana passada, num comunicado enviado à agência Lusa, Hernâni Dias recusou ter cometido qualquer ilegalidade, afirmando que está "de consciência absolutamente tranquila" e que agiu "com total transparência".
O secretário de Estado garante ter pedido ao Ministério Público (MP) "que investigasse a empreitada da Zona Industrial em Bragança e ao LNEC [Laboratório Nacional de Engenharia Civil] que fizesse uma auditoria", assegurando, relativamente ao apartamento ocupado pelo filho no Porto, que "o valor das rendas foi pago por transferência.