
Segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021. O FC Porto comunicou, a meio da tarde, a notícia que corria, sem confirmação oficial, de que Alfredo Quintana estaria em estado grave, após colapsar no treino da manhã da equipa de andebol do FC Porto.
« O atleta de andebol Alfredo Quintana sofreu uma paragem cardiorrespiratória durante o treino de hoje, tendo sido prontamente assistido com o apoio de uma viatura do INEM. Depois de estabilizado, foi transportado para o Hospital de São João, onde se encontra internado», anunciou o clube azul e branco.
A mensagem, sem grandes detalhes, não augurava nada de bom. Em todo o lado, ouvia-se que a situação era grave, o silêncio em volta do assunto adensava a angústia.
Alfredo Quintana tinha 32 anos, porte atlético, um sorriso fácil, o sangue doce cubano em cada palavra, e brilhava na baliza do FC Porto e da Seleção Nacional.
Quando chegara, 10 anos antes, foi o primeiro cubano da vaga que daria a Portugal muitos e bons atletas que acabariam por naturalizar-se. Era um miúdo, com 2,01m, que já tinha representado Cuba num Mundial, em 2009.
Cinco dias depois de ter sido internado, a 26 de fevereiro, o pior cenário confirmou-se e o mundo azul tornou-se cinzento. O FC Porto comunicou o pior desfecho.
«A mensagem que nunca pensámos partilhar: o nosso querido Alfredo Quintana partiu hoje. Serás para sempre lembrado como um dos nossos. Um verdadeiro Dragão. Descansa em paz, Eterno Quintana!»
Pinto Costa mandou retirar o número 1 e mais ninguém na equipa de andebol vestirá aquele número.
Adiós Havana, hola Porto
Alfredo Eduardo Quintana Bravo nasceu a 20 de março, em Havana. Voleibol, beisebol, basquetebol, tudo lhe agradava até chegar ao andebol. Jogou no Industriales e na equipa nacional.
Não desertou de Cuba, mas forçou a saída para correr atrás do sonho de jogar na Europa. Um colega recomendou-o ao FC Porto quando soube que o clube procurava um guarda-redes.
O Campeonato Pan-Americano, no Chile, em 2010, teve um enviado-especial dos dragões e o diretor regressou com o ‘certificado’ de qualidade do guarda-redes, então com 21 anos.
O FC Porto deu-lhe casa, seguro e um contrato e Alfredo Bravo fez justiça ao apelido e enfrentou a federação cubana. ««Foi como uma bomba», contou, em Junho de 2020, ao canal de youtube El Camerino.
Não era permitido, não seria permitido. Os cubanos não saem. Mas Quintana saiu, com o pai, internacional de voleibol, a mexer todas as influências que podia. E conseguiu que o miúdo, que um dia, por acaso, foi parar à baliza (faltou um guarda-redes e ele ofereceu-se) partisse atrás do sonho.
Seduzir os conservadores
Durante 11 anos vestiu a camisola dos dragões e três anos depois de chegar, naturalizou-se português e passou a representar a Seleção Nacional.
No início, com alguma desconfiança dos mais conservadores, mas duraram pouco as reticências. A sua qualidade rapidamente desfez quaisquer dúvidas e o jeito simples acabou por conquistar adeptos, companheiros e adversários. Gustavo Capdeville, guarda-redes do Benfica, ganhou um prémio-fair play por usar o seu nome na camisola oficial e levou às lágrimas até os mais durões quando brincou com a filha de Quintana, Alicia, em pleno Dragão Arena.
«Sabia a responsabilidade que tinha quando vesti pela primeira vez a camisola da Selecção deste país, que me recebeu como um filho. Aqui no Porto toda a gente me conhece e se dá muito bem comigo e tenho de agradecer a Portugal por isso», sublinhava ao El Camerino.
Seriam 67 jogos de Quintana na baliza da Seleção. «O Polvo Português», chamou-lhe a Federação Europeia de Andebol após o 6.º lugar no Campeonato da Europa, ainda antes do 10.º no Mundial, já em 2021.
Depois desse torneio ainda fez sete jogos pelo FC Porto. O último dos quais na véspera do fatídico treino que o atirou irremediavelmente para os cuidados intensivos. Frente ao Águas Santas. Marcou dois golos, incluindo aquele que fechou a vitória portista por 34-26, a oito segundos do fim.
Nessa viagem, que acabaria aos 32 anos, no Porto que amou, Quintana conquistou seis títulos de campeão nacional, uma Taça e duas Supertaças. Festejou ao som de Cuba. Sempre, do ritmo que o embalava para todo o lado e quer o acompanhava de forma ruidosa.
Em Portugal apaixonou-se e teve uma filha.
Disse sempre que não era um «sobrevivente» mas sim um «guerreiro».
Há diferenças. Muitas, em tentar viver e em lutar por viver.
Alfredo Quintana lutou sempre e só a morte o parou. Faz hoje quatro anos.